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terça-feira, 31 de maio de 2016

A pesquisa como princípio pedagógico

A educação fundada simplesmente na transmissão de conhecimento é a maior ruptura que precisamos promover no Brasil. Essa ruptura não é apenas um modismo pedagógico. Ela é necessária para se construir uma agenda escolar mais significativa para os estudantes, principalmente no ensino médio.

Antes de prosseguir com essa reflexão, quero deixar claro que não se trata da eliminação da aula expositiva. Ela continua tendo importância como estratégia didática. A exposição de um conteúdo pelo professor permite ao aluno compreender como organizar o conhecimento científico no contexto de um discurso. E isso é um grande aprendizado. Faço essa ressalva pois muitos educadores tendem a radicalizar quando é abordado a necessidade de uma estrutura didática participativa, em que os estudantes são o centro do processo, como é o caso da pedagogia de projetos e da pesquisa.

Não é novidade para nenhum educador, e creio ser um consenso, que um estudante, ao se envolver numa pesquisa científica, aprende a aprender no decorrer do processo de investigação. E esse aprendizado não pode esperar a pós graduação para ser desenvolvido. Tem que ser estimulado na educação básica.

Não há contribuição mais impactante da escola na vida de um cidadão em formação cidadã do que a promoção da autonomia intelectual. E sobre isso não tenho dúvida: oportunizar aos estudantes o domínio do método científico e sua aplicação em pesquisas científicas é um pilar da educação escolar de nosso tempo.

É importante desmistificar a crença que a pesquisa científica é para poucos sob o pretexto de que que muitos alunos não tem a disciplina necessária para estabelecer o rigor que legitime os "achados" da pesquisa. Ora, é preciso superar o saber natural. Protagonismo estudantil e rigor científico se educa.

Portanto, todos os alunos podem aprender a desenvolver pesquisas na educação básica e extrair o que há de melhor no processo de aprendizagem escolar: a autoria.

A educação pensada em sujeitos

Um dos maiores equívocos é estruturar uma escola para os sem rosto, sem história, sem nome.

A escola é a instituição responsável para apresentar aos jovens as informações e conhecimentos sistematizados e acumulados pela humanidade. Isso caracteriza a educação formal. Mas me preocupa a forma como isso acontece no cotidiano do ensino e aprendizagem.

A agenda escolar é elaborada, quase como regra, sem considerar os sujeitos que a frequentam. Infelizmente ainda estamos organizados para ofertar uma educação para massas, no modelo série, como nas fábricas.

Primeiro se dá o conteúdo, depois se pergunta se foi interessante e significativo. E se a resposta for NÃO, e na maioria das vezes não é, logo os estudantes são acusados de não quererem nada com a vida e ganham o taxativo selo de desinteressados pela escola.

Uma outra organização escolar é possível. Mas nós educadores precisamos desenvolver uma habilidade bem específica para melhorar a relação com os estudantes: saber ouvir e ler as suas histórias de vida.

Esta habilidade permite aos educadores, entre outras coisas, enriquecerem suas práticas pedagógicas, consolidando a desmassificação das relações e do ensino.

Portanto, desenvolver a premissa do estudante como sujeito poderá gerar a maior transformação de todos os tempos na educação escolar. E aí veremos o por que é tão importante pensar em diversificar itinerários formativos, estruturar tempos eletivos e contextualizar o que se ensina.

O que fazer com os sonhos dos jovens?

Essa questão é colocada para os adultos, pois os jovens simplesmente sonham, e sonham muito, e que bom que sonham!

Faço essa pergunta ao meu silêncio todos os dias. E geralmente a minha conclusão é que nós não conseguimos dialogar bem com as expectativas desses sujeitos, seja em casa, como pais, ou na escola, como profissional da educação.

Penso às vezes que se manifesta nessa relação uma espécie de vingança dos adultos por não terem conseguido emplacar boa parte dos seus sonhos quando passávamos por esta construção ideária do futuro.

Penso também na expressão que o Brasil é o país do futuro pois tem muitos jovens em formação e o por que desta máxima nunca ter se confirmado efetivamente. Será que isso aconteceu porque ao invés de interpretarmos as novas visões de futuro manifesta nos sonhos dos jovens preferimos fazer os jovens se adequarem ao presente? Se a resposta for sim, explica a repetição de práticas geração após geração.

Após muitas reflexões a respeito, minha conclusão é que nós precisamos construir uma relação com os jovens de modo a ajudá-los a elaborar seus projetos de vida, dando a eles condições para realizarem seus sonhos, ao contrário de convencê-los a esquecer que o futuro pode ser bem melhor que o presente.

É nesse contexto que se fala tanto em protagonismo juvenil, estudantil. Para termos uma educação verdadeiramente significativa, os jovens precisam aprofundar sua percepção sobre si mesmos e projetar seus sonhos de uma vida cheia de mudanças e de realizações bem sucedidas, mas que precisa ser esboçada a partir de ações concretas no presente.

Educar jovens no ensino médio

Educar jovens no ensino médio está entre os grandes desafios na atualidade. Este ponto está na pauta de sistemas de ensino do mundo inteiro, mas é ainda mais desafiador em países com desigualdades de oportunidades educacionais elevadas, como o Brasil.

Pelo tamanho do desafio, devemos pensar em estratégias de abrangência macro, ou seja, de políticas educacionais, e de fortalecimento do clima escolar, alicerçado nos preâmbulos de uma escola para as juventudes.

Considerando esse cenário, creio que é preciso pensar no seguinte:

- No âmbito das definições e atividades das secretarias de educação: a) garantir as condições de funcionamento da escola, priorizando a autonomia financeira e pedagógica de cada unidade; b) liderar discussões com sua rede para sistematização de inovações relacionadas a modelos de gestão, a organização curricular e a tecnologias educativas; c) estabelecer princípios inegociáveis a serem atentados em todos os segmentos da rede. Sobre esses princípios, faço referência principalmente aos relacionados a inclusão educacional, a altas expectativas de elevação de resultados acadêmicos e a crença de que todos são capazes de aprender, independente da situação econômica e social.

- No âmbito da estrutura escolar: a) consolidar a pedagogia do diálogo e a sistemática de construção coletiva de entendimentos naquilo que precisa ser realizado para que a escola cumpra seu papel social e garanta a aprendizagem dos seus estudantes; b) focar nos aspectos da aprendizagem em sala de aula, no suporte ao processo de ensino e no cuidado para que os alunos verdadeiramente sintam-se contemplados no processo; c) criar e fortalecer o sentimento de que todos os estudantes, todos, são capazes de desenvolverem seus projetos de vida tendo a educação como pilar.

A lista do que é preciso estruturar deve ser pequena mesmo. Os desdobramentos de cada item mencionado acima são complexos, e a dispersão de energia das secretarias e das escolas não ajuda, absolutamente, em nada.

Apoio ao trabalho do professor

O trabalho do professor não pode ser solitário. Deve ser, acima de tudo, cooperativo e solidário. A escola,  portanto, precisa se organizar para dar o apoio necessário no sentido de proporcionar a construção de saberes e práticas coletivas.

A tarefa de educar crianças e jovens é complexa, principalmente no contexto da educação pública, onde a diversidade de interesses está mais presente. O trabalho individual, nesse contexto, gera intranquilidade para o professor.

Logo, é importante que se enfatize, educar é muito mais que preparar a exposição de um conteúdo. A gestão da sala de aula requer outros planejamentos que extrapolam o domínio do conteúdo e exigem a organização de uma didática que esteja sintonizada com as características dos estudantes.

O diálogo entre pares, permanente e sistemático, na elaboração de planos de aula e formação contínua, deve ser garantido para que o professor se sinta seguro no desenvolvimento de sua prática docente.

Diretor(a) escolar, e sua equipe de coordenadores, precisa concentrar esforços para garantir esse apoio aos professores. As demais tarefas, são de segunda ordem.

Ser professor é algo fantástico

Não me canso de expressar a felicidade de ter feito a diferença na vida de jovens que se tornaram homens e mulheres de bem. E o mais importante: ser reconhecido por essas pessoas como "referência".

Claro que podemos ter uma carreira muito mais valorizada, e precisamos estar em busca disso constantemente. Mas não podemos negar que nossa profissão gera sentimentos que não estão vinculados à remuneração. Ter o privilégio de conviver com crianças e jovens rejuvenesce e nos inspira na busca de ser um cidadão melhor, e espero, um pai melhor. Portanto, um privilégio.

Que outra profissão permite a interação com quem tem o "mundo pela frente", todos os sonhos tratados como real possibilidade? Pois é, com o tempo nos tornamos careta! Isso quer dizer que a vida passa a ser tratada de forma pragmática, em preto e branco. Dessa forma, nossos alunos nos ajudam na resistência pela manutenção do colorido.

Assim, a boa relação professor-aluno deve se estabelecer no princípio de desenvolvimento mútuo de expectativa e de aprendizagem.  Não tenho dúvida que se pensar assim propicia a criação de um clima pedagógico mais equilibrado e favorável para a construção de uma aprendizagem sólida e de uma afetividade capaz de desenvolver aspectos socioemocionais, do profissional e do estudante.

Quero dizer, contudo, que nós professores ao estabelecermos uma relação mais horizontal, apoiando a aprendizagem cooperativa, por exemplo, contribuiremos para a fundação de uma escola que faça sentido para as juventudes.

O Ceará leva o ENEM muito a sério

As escolas públicas de ensino médio incluíram na sua agenda o incentivo e a permanente discussão com os estudantes sobre a importância deste exame para ampliação das oportunidades relacionadas a continuação dos estudos, seja em instituições de ensino superior ou em formação técnica e tecnológica.

O entusiasmo dos estudantes e professores no processo de inscrição é algo diferenciado. Maior parte das escolas registra 100% de inscrições dos alunos da 3ª série do ensino médio, e até mesmo da 2ª série, que é resultado de um intenso trabalho no início do ano, sob o lema #ENEMChegojuntoChegobem, e que garante que todos tenham a documentação exigida para inscrição.

Este apoio ao ENEM gera um movimento pedagógico e político na rede estadual: a-) pedagógico porque as escolas organizam suas atividades de ensino e aprendizagem buscando alinhamento com temas tratados nesta prova e se aproveita de um clima favorável de entusiasmo dos estudantes para fortalecer a rotina de estudo, dinamizada pelo protagonismo dos jovens; b-) político porque definitivamente traz para o centro do debate educacional a assertiva de que todos os alunos, todos mesmo, podem ser bem sucedidos nos estudos durante o ensino médio, estabelecendo um clima de inclusão inconteste e de altas expectativas.

Portanto, aos educadores cearenses que tornam este movimento possível, meu reconhecimento e aplausos!

O currículo do ensino médio

O currículo do ensino médio nos desafia. Portanto, nós educadores, pensemos sobre ele todos os dias!

E a questão chave é a seguinte: como estruturar uma escola e sua dinâmica de aprendizagem de modo a respeitar as diferenças que se manifestam nos projetos de vida de cada sujeito?

A conclusão mínima desta reflexão é que a escola de ensino médio não pode se assemelhar a uma linha de produção, ou seja, ter cinquenta minutos de aula de uma disciplina e aí outro professor entra e discorre sobre o seu conteúdo e assim por diante.

Não dá outra: assim, é educação bancária!

Foi nesta escola que eu estudei e que meus antepassados, que tiveram acesso a escola, estudaram.

Podemos fazer diferente. Os tempos exigem uma aprendizagem diferente. Temos uma legislação educacional que nos permite respeitar os interesses dos jovens e organizar uma escola que dialogue com os seus sonhos e que consiga criar um itinerário formativo mais atrativo e significativo, em que o estudante se posiciona como protagonista e é capaz, portanto, de fazer escolhas.

Está em curso no Ceará uma proposta de ensino médio em tempo integral que requer atenção. Há um modelo diferente sendo trilhado.

Nesta experiência, parte significativa das atividades, 10h semanais, é composta por tempos eletivos em que cada estudante escolhe um itinerário formativo de acordo com seus interesses, que variam do domínio de uma língua estrangeira ao karatê. Em cada escolha, uma nova turma, novos amigos de sala, reunidos pelo interesse de estudar junto um tema que os aproxima.

Além das eletivas, o Núcleo Trabalho, Pesquisa e demais Práticas Sociais (NTPPS), proporciona aos estudantes duas experiências formativas formidáveis: a) o "mergulho em si mesmos", quando são orientados a escrever seus projetos de vida e a refletir sobre sua identidade; b) o desenvolvimento de práticas de pesquisa científica, o Aprender a Aprender.

Cito esta experiência para termos mais elementos de crítica e aprofundamento de nossa reflexão sobre este tema, muito caro para a educação brasileira na atualidade.