Por *Homero Henrique de Souza
Diante da onda de supostas leis municipais que proíbem toda e qualquer discussão sobre a diversidade humana nas suas relações de gênero e sexualidade denominando essas discussões de “ideologia de gênero” é preciso alguns esclarecimentos e reflexões:
1º - O Plano Nacional de Educação (PNE) e o Plano Estadual de Educação do Ceará (PEE) NÃO PROÍBEM as discussões de gênero e sexualidade na escola. Apesar da exclusão dos termos GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL e IDENTIDADE DE GÊNERO, as estratégias 3.20 e 7.20 do PNE preveem respectivamente a “Implementação de políticas de prevenção à evasão motivada por preconceito ou quaisquer formas de discriminação, criando rede de proteção contra formas associadas de exclusão escolar” e “Criação e fortalecimento de políticas de combate à violência e mediação de conflitos, inclusive pelo desenvolvimento de ações destinados à capacitação de educadores para detecção dos sinais de suas causas, como a violência sexual, (…), para promover a construção da cultura de paz (...). No PEE, a estratégia 8.8 disserta “Garantir a formação inicial e continuada de professores, gestores e demais profissionais da educação para desenvolver uma cultura de acolhimento, respeito, inclusive quanto a todos os preconceitos e opressões em razão de sua orientação sexual”;
1º - O Plano Nacional de Educação (PNE) e o Plano Estadual de Educação do Ceará (PEE) NÃO PROÍBEM as discussões de gênero e sexualidade na escola. Apesar da exclusão dos termos GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL e IDENTIDADE DE GÊNERO, as estratégias 3.20 e 7.20 do PNE preveem respectivamente a “Implementação de políticas de prevenção à evasão motivada por preconceito ou quaisquer formas de discriminação, criando rede de proteção contra formas associadas de exclusão escolar” e “Criação e fortalecimento de políticas de combate à violência e mediação de conflitos, inclusive pelo desenvolvimento de ações destinados à capacitação de educadores para detecção dos sinais de suas causas, como a violência sexual, (…), para promover a construção da cultura de paz (...). No PEE, a estratégia 8.8 disserta “Garantir a formação inicial e continuada de professores, gestores e demais profissionais da educação para desenvolver uma cultura de acolhimento, respeito, inclusive quanto a todos os preconceitos e opressões em razão de sua orientação sexual”;
2º - Nenhuma legislação municipal pode se sobrepor as constituições federal e estadual. O art. 3º da Constituição Federal diz que: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. O art. 14 da Constituição Estadual do Ceará coloca que: “O Estado do Ceará, pessoa jurídica de direito público interno, exerce em seu território as competências que, explícita ou implicitamente, não lhe sejam vedadas pela Constituição Federal, observados o seguinte princípio - defesa da igualdade e combate a qualquer forma de discriminação em razão de nacionalidade, condição e local de nascimento, raça, cor, religião, origem étnica, convicção política ou filosófica, deficiência física ou mental, doença, idade, atividade profissional, estado civil, classe social, sexo e orientação sexual”;
3º - A falaciosa expressão ideologia de gênero presente em alguns planos educacionais é uma expressão criada no interior de uma parte conservadora da Igreja Católica e no movimento pró-vida e pró-família que, no Brasil, parece estar centralizado num site chamado Observatório Interamericano de Biopolítica. O termo é usado em 1998, em uma Conferência Episcopal da Igreja Católica realizada no Peru. Seus criadores se baseiam em dois livros para compor essa narrativa. Primeiro, no livro de Dale O’Leary intitulado Agenda de gênero, de 1996. O’Leary é uma militante pró-vida que participou das Conferências da ONU (do Cairo em 1994 e de Pequim em 1995) como delegada. Ela faz um relato dessas conferências, descreve, sob o seu ponto de vista, a ação das feministas em apresentar o conceito gênero e como, a partir dali, a ONU assume a chamada perspectiva de gênero para as políticas públicas sobre os direitos das mulheres. O outro referencial usado na construção dessa narrativa é o livro de Jorge Scala, cuja primeira edição é intitulada Ideologia de gênero: o gênero como ferramenta de poder, de 2010, que no Brasil, curiosamente, é intitulado Ideologia de gênero – o neototalitarismo e a morte da família, de 2015. O autor é um advogado argentino, conhecido defensor contra os direitos das mulheres, membro do movimento pró-vida, que apresenta uma série de interpretações dos estudos de gênero, extremamente problemáticas e convenientemente articuladas para desqualificar tais estudos e apresentá-los como danosos para a sociedade (FONTE: Furlani, 2016 disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=5ro1O10l0v8&t=318s). Essa criminosa e desumanizadora “ideologia de gênero” faz parte de um projeto maior, o Escola Sem Partido que foi retirado de votação do Senado durante essa semana (https://www.revistaforum.com.br/2017/12/08/projeto-escola-sem-partido-e-arquivado-no-senado/) e foi revogado por ser inconstitucional no único estado brasileiro onde ele chegou a ser “implementado” (https://educacao.uol.com.br/noticias/2017/03/22/stf-suspende-lei-de-alagoas-que-pune-opiniao-de-professor-em-sala-de-aula.htm);
4º - Por outro lado 47% dos estudantes brasileiros já sofreram algum tipo de bullying na escola (por aparência, orientação sexual ou pela sua feminilidade/masculinidade – expressões de gênero); 20% dos estudantes brasileiros rejeitam colegas de classe homossexuais, bissexuais e/ou transexuais; 60% dos estudantes brasileiros LGBT se sentem insegurxs na escola em função da sua orientação sexual; 39% das estudantes brasileiras já sofreram preconceito na escola por serem mulheres. Todos esses dados estão postos nas pesquisas a seguir:
- Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar, IBGE, 2015;
- Juventudes Na Escola, Sentidos e Buscas: Por que Frequentam?, Flacso/OEI/MEC, 2015;
- Pesquisa Nacional sobre o Ambiente Educacional Brasileiro, ABGLT, 2016;
- #meninapodetudo – machismo e violência contra a mulher na juventude, Agência Enóis, 2015.
5º - Para além da falácia da “ideologia de gênero”, a sociedade brasileira vive realidades concretas: 43 mil mulheres assassinadas na última década, 96% dos jovens brasileiros admitem a existência do machismo no Brasil mas boa parte ainda aprova valores machistas e reprova comportamentos não conservadores da mulher, 78% das jovens brasileiras já foram assediadas em locais públicos, 43% dos jovens presenciaram a mãe ser agredida, 37% das mulheres já tiveram relações sexuais sem camisinha por insistência do parceiro. Esses e tantos outros dados disponíveis na pesquisa Violência contra a mulher: o jovem está ligado? do Instituto Avon/Data Folha evidenciam a violência contra a mulher, os relacionamentos abusivos e a cultura do estupro cada vez mais presente em nossos valores sociais; no Brasil, um homem comete suicídio 4 x mais que as mulheres (ONU Mulheres) fruto da masculinidade tôxica que distorce a concepção de masculinidade desde a mais tenra infância (homem não chora, se apanha, bate, deve iniciar a vida sexual logo que entra na puberdade, pode e deve ter várias parceiras sexuais e na fase adulta é quem deve prover a família); a cada 28h, 1 LGBT é barbaramente assassinado no país; a expectativa de vida de uma pessoa transexual/travesti é de apenas 35 anos (Grupo Gay da Bahia); de 2006 a 2015, o número de brasileiros infectados pelo vírus da AIDS saltou, na faixa etária de 15 a 19 anos, de 2,4 para 6,9 para cada cem mil habitantes (Ministério da Saúde).
6º - Por tudo isso e muito mais que pretendo escrever em outros textos indago a você que está lendo esse texto até aqui: A ESCOLA PRECISA OU NÃO FALAR DE GÊNERO E SEXUALIDADE?
Pensemos (...)
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*Homero Henrique de Souza é professor da rede estadual do Ceará e mestrando em Políticas Públicas Educacionais
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