quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Reprovação não devia ser uma possibilidade numa educação de qualidade (Parte 1)

A cultura escolar brasileira coloca para o estudante, e somente para ele, a responsabilidade de aprender o que se ensina na escola. Consolidou-se a visão do autodidatismo e da expectativa de aprendizagem associada a noção distorcida de meritocracia. Ora, a aula foi a mesma para todo mundo e teve quem demonstrasse aprendizagem, por que então os demais não aprenderam? Essa pergunta é apenas retórica, a resposta está sedimentada: só depende do aluno estudar e aprender, pois o conteúdo foi passado da mesma forma. Para checar esse pressuposto, basta lembrar de reuniões da escola com os pais, essa máxima sempre aparece.

Um sistema baseado em aulas expositivas, como claramente é o nosso, parte do pressuposto que para desenvolver aprendizagem dos estudantes, basta disponibilizar informações sobre os conteúdos selecionados e organizados no currículo da escola. Por conta deste pressuposto, talvez, sejamos tão obcecados em dar todos os conteúdos programados para o ano, mesmo que para isso precisemos deixar a grande maioria dos estudantes para trás, sem aprender efetivamente os conteúdos abordados. É só observar o resultado das avaliações internas de qualquer escola. O percentual de alunos com notas abaixo da média é gritante, mas visto com uma normalidade arrepiante. A explicação para as notas baixas é muito simples: os alunos não estão interessados nos assuntos da escola. Será mesmo?

Não tenho outra metáfora mais suave para ilustrar essa tese: a escola é pensada no Brasil para ser um teste de sobrevivência à selva, cheia de armadilhas e missões perigosas que envolvem pântanos cheios de jacarés e passagem por areia movediça. Os sobreviventes tem um fluxo de escolarização regular, o que acontece com 61,4% dos jovens de 15 a 17 anos que cursam o ensino médio, de acordo com a PNAD de 2014. Os demais, por outro lado, não conseguiram atravessar o percurso, ficando reprovados sucessivamente (que é o equivalente a mordidas de um jacaré, na metáfora) e que muitos tiveram que abandonar a escola precocemente, ainda no ensino fundamental (o que é equivalente a ser engolido pela areia movediça do pântano metafórico).

O Brasil consegue colocar quase a totalidade das crianças na escola no primeiro ano de escolarização. Mas não consegue criar as condições para permanência. É evidente que essa questão não está associada apenas ao desenho pedagógico da escola. Há questões sociais graves em nosso país, e por falta de uma rede de proteção robusta para crianças e jovens, que as protejam dos vários fatores sociais de risco que as ameaçam diariamente num cenário de extrema desigualdade de acesso à oportunidades, a permanência na escola é um desafio que deve mobilizar vários setores do poder público, e não é, portanto, somente da escola. Mas daí afirmar que está tudo bem com o nosso conceito de ensino e aprendizagem e jogar tudo para a conta dos fatores externos, é demais. A cultura da reprovação, símbolo maior do esforço de jogar para os alunos a responsabilidade por aprender, contribui para que o estudante não permaneça na escola.

Quero falar mais sobre a reprovação trazendo a percepção de Sérgio Costa Ribeiro. Num artigo bastante citado, de 1991, intitulado A pedagogia da repetência, esse pesquisador afirma o seguinte: "Parece que a prática da repetência está contida na pedagogia do  sistema como um todo. É como se fizesse parte integral da pedagogia,  aceita por todos os agentes do processo de forma natural. A persistência  desta prática e da proporção desta taxa nos induz a pensar numa verdadeira  metodologia pedagógica que subsiste no sistema, apesar de todos  os esforços no sentido de universalizar a educação básica no Brasil."

Uma educação emancipadora e que tem em sua base a garantia de direitos, não pode ter a possibilidade da reprovação como fio condutor do processo educativo. Ao contrário, o prazer em desenvolver conhecimentos significativos é que deve fazer parte do imaginário de educadores e estudantes no cotidiano escolar. Os sistemas de ensino e as escolas precisam estar orientadas para garantir aos estudantes o direito de aprender. A reprovação, ao contrário do que temos hoje, não pode ser utilizado como recurso didático para mobilizar crianças e jovens a estudarem mais. Um outro Projeto Político Pedagógico é possível, pautado numa visão mais inclusiva de educação.

Não quero passar a ideia de culpabilização das escolas e retirada das responsabilidades dos estudantes. Não é tão simples assim. O protagonismo estudantil é uma bandeira que prezo muito. Mas não podemos cair na tentação de, em nome desse protagonismo, criar um regime escolar baseado nas exceções, onde quem conseguiu por conta própria superar todos esses desafios é a prova de que não há problemas com o processo educativo, e sim com os estudantes. A escola é responsável sim em estabelecer um clima de ensino e aprendizagem inclusivo, que consiga dar conta em assistir necessidades educativas específicas dos alunos que não conseguem aprender somente com o que é apresentado de forma massiva para todos por meio das aulas. Outras possibilidades educativas precisam ser pensadas para não deixarmos nenhum estudante desprovido do seu direito de aprender.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Uma escola pública democrática e republicana (Parte 2)

Elaborar um projeto pedagógico que proporcione emancipação intelectual aos jovens é o grande desafio da escola pública.

Nessa perspectiva, a questão colocada é a seguinte: como estruturar um projeto de aprendizagem de modo a consolidar o engajamento desses sujeitos a vida escolar na busca pela autonomia intelectual?

De forma proposital, a pergunta não faz referência a projeto de ensino, e sim de aprendizagem. Não se trata apenas de questão semântica, mas de mudança de paradigma com vista a uma educação pautada na garantia de direitos, no caso, o da aprendizagem.

Quando falamos projeto de ensino, a responsabilidade da escola é com a transmissão sistemática dos conteúdos. Ao estudante cabe ir atrás do professor e se responsabilizar por sua aprendizagem. Quando o aluno não consegue, é reprovado ou abandona precocemente a escola.

Numa escola que se quer republicana, o foco é a garantia do direito. Assim, escola boa é aquela onde se aprende, e não, simplesmente, onde se ensina. Leva tempo para se perceber que o ensino, descolado de um rigoroso processo de acompanhando da aprendizagem, não garante esse direito.

É preciso uma postura proativa por parte dos profissionais da escola identificando as dificuldades de aprendizagem apresentada por cada um dos estudantes com o propósito de se elaborar estratégias para ajudá-los a desenvolverem seus processos de aprendizagem. Requer, portanto, análise dos processos avaliativos e uma gestão pedagógica que permita a inclusão de todos ao projeto político.

O sistema educacional brasileiro está erguido sobre um pensamento pedagógico autoritário, pouco dialógico, que desenha o currículo a partir de uma hierarquia de saberes e desconsidera, em grande medida, os interesses dos jovens em desenvolver aprendizagens que se relacionam aos seus projetos de vida.

No modelo curricular predominante, o mapa de disciplinas é definido pela escola, e os estudantes são obrigados a seguir essa pré-definição. Com um mapa curricular rígido assim, claramente enfrentaremos problemas graves quanto a garantia do direito à aprendizagem para todos, pois se parte do pressuposto fabril da linha de produção, onde os alunos como produtos da escola precisam obrigatoriamente passar por todos os processos de ensino disponíveis.

Nesse modelo, ignora-se as diferenças e os interesses individuais, tornando a escola desinteressante para a maioria dos jovens.

Na perspectiva de criar uma nova estrutura curricular, está em curso nas escolas regulares de ensino médio em tempo integral no Ceará uma proposta de desenho dos tempos de aprendizagem mais flexível.

Das 45 horas semanais, 30 são destinadas aos conteúdos clássicos do currículo, organizados em disciplinas como hoje a conhecemos. Nas demais 15 horas ocorrem as atividades mais flexíveis, a saber: 4h para o Núcleo Trabalho Pesquisa e Práticas Sociais (NTPPS); 1h para Formação para a Cidadania, relacionada ao Projeto Professor Diretor de Turma; e 10h são destinadas aos Tempos Eletivos, as quais nos deteremos neste artigo.

Os Tempos Eletivos estão organizados numa perspectiva de semestralidade. Assim, são 5 temas eletivos com 2h semanais que o estudante pode escolher em cada semestre. Os Tempos Eletivos são ofertados em horários convergentes para todas as turmas de tempo integral, ou seja, no mesmo horário, os estudantes das diferentes turmas e séries estão na sala em que será desenvolvido o tempo eletivo.

Neste modelo, para deixar claro, estudantes das três séries do ensino médio podem estudar, na mesma sala, os mesmos temas eletivos, criando novas interações sócio educativas, pautadas nos mesmos objetivos de aprendizagem.

Os Tempos Eletivos trazem uma grande inovação - já garantida pela LDB de 1996 sem a necessidade de alteração proposta pela controversa Medida Provisória do Governo Temer - relacionada a diversificação do currículo do ensino médio, permitindo itinerários formativos que oportunizem aos estudantes o aprofundamento de temas de seus interesses e necessidades.

Desta forma, os estudantes poderão estudar ao longo dos 3 anos do ensino médio 30 temas eletivos, compondo um histórico escolar específico, único, que registra os tempos de estudo em áreas de seu interesse. 

A escola, no âmbito dessa proposta, poderá dar atenção específica para os estudantes que requerem o fortalecimento das competências básicas de leitura, escrita e raciocínio lógico matemático ao oferecer temas eletivos estruturantes do saber cognitivo e, ao mesmo tempo, criar oportunidades avançadas de aprendizagens em áreas específicas, como línguas estrangeiras e tecnologia, por exemplo.

Essa inovação pedagógica busca abrir caminhos para um desenho de escola para os jovens sintonizada com seus projetos de vida. As trilhas de saberes, numa escola republicana, precisam ser diversas e significativas. Respeitar a diversidade típica dos seres humanos é diversificar os itinerários formativos.

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Uma escola pública democrática e republicana (Parte 1)

A escola democrática e republicana se constitui no seguinte fundamento: a formação cidadã deve estar baseada na autonomia e na emancipação dos sujeitos.

A escola pública é uma das principais estruturas políticas de uma sociedade democrática, em potencial, que deve garantir condições igualitárias de acesso ao conhecimento socialmente produzido, e, nesta medida, oportunizar melhores condições sociais e de acesso aos bens culturais e científicos a toda a população, sem distinção de cor, condições socioeconômicas ou qualquer outra característica física ou cultural dos estudantes.

Sem esse entendimento, a escola pública apenas reproduz a desigualdade historicamente materializada, deixando de lado seus princípios políticos, relacionados ao acesso e criação de oportunidades para transformação do status quo.

O Brasil tardiamente começou a levar a sério a escola pública - as evidências históricas mostram isso. Por conseguinte, hoje fala-se abertamente em reformas educacionais com vistas a superar anos de relativo "atraso" na organização de seus sistemas de ensino. No entanto, preocupam-me a forma e os princípios que regem tais "reformas", pois é preciso observar as bases ideológicas que as sustentam.

Serei claro a esse respeito. A escola foi institucionalizada em meados do século XIX sob o forte pretexto de educar, em larga escala, as pessoas para permitir a apropriação de valores caros à organização produtiva. O princípio pedagógico da simultaneidade foi instaurado, ou seja, as crianças, que antes eram educadas individualmente, em casa, passaram a compartilhar os ensinamentos de um professor com outras crianças em uma sala de aula. Claramente, esse modelo de educação não tinha a intenção de formar cidadãos livres e críticos, mas produtivos em sua última finalidade.

Com o passar do tempo, principalmente com o esgotamento do pragmatismo educacional de se ensinar, somente, conteúdos associados ao cognitivo, buscou-se alargar as possibilidades formativas, inserindo novas dimensões socioeducativas. Há de se ressaltar que esse movimento de reformas educacionais está presente em todas as nações democráticas.

Um dos meus argumentos neste texto não está relacionado à negação do mundo do trabalho no processo educativo, e sim à necessidade de formação integral dos sujeitos em uma perspectiva mais abrangente, que considere inclusive as relações produtivas, mas que não se esgote nelas.

Nesses últimos anos, o ensino médio brasileiro está em discussão com vistas à promoção de mudanças relacionadas à organização curricular. Fala-se em dar aos estudantes a prerrogativa de escolher uma ênfase a ser aprofundada ao longo do ensino médio, de acordo com a Medida Provisória nº 746/2016, cujo principal argumento é desmontar a "esquizofrenia" de se trabalhar 13 disciplinas ditas obrigatórias.

De fato, ao analisar outros modelos curriculares praticados no ensino médio mundo afora, percebe-se uma maior flexibilização do currículo, caracterizada pela possibilidade de os estudantes realizarem escolhas sobre seus itinerários. Contudo, em nenhum sistema, é importante que se frise, o estudante, ao escolher uma ênfase, terá de obrigatoriamente cursá-la ao longo de todo o ensino médio. Em todas elas, o jovem faz suas escolhas na perspectiva de encontrar respostas a seus anseios do momento, de modo que tenha melhores condições de tomar decisões pós educação básica sobre carreira profissional e/ou acadêmica.

É preciso diversificar e ampliar caminhos, variar oportunidades, e não estreitar o currículo em "ênfases". Esse remodelamento condicionado à MP pode subtrair da formação dos sujeitos elementos importantes para a formação integral ao esvaziar possibilidades, tendo em vista que não será possível alterações de itinerários ao longo do ensino médio, como sugere o atual §10 do Art. 36 da LDB, inserido pela MP, "os sistemas de ensino, mediante disponibilidade de vagas na rede, possibilitarão ao estudante concluinte do ensino médio cursar, no ano letivo subsequente ao da conclusão, outro itinerário formativo de que trata o caput." Essa lógica não está dialogando com o discurso da flexibilização que serve de pretexto para defender a utilidade desta Reforma.

Para que fique claro: no modelo flexível adotado em outros países, diversificar o currículo pressupõe que, a cada período, o estudante faça escolhas sobre o que pretende estudar com o propósito de dinamizar a experiência escolar, tornado-a mais significativa. Desse modo, os estudantes escolhem temáticas relacionadas à arte, educação física, história e matemática num semestre, por exemplo, e no outro faz escolhas de assuntos associados a outras matrizes do conhecimento, caso assim o decidam.

Da forma como está, a proposta de remodelamento presente na MP 746 retira oportunidades para se construir uma formação sólida, diversificada quanto à matriz científica e cultural disponível aos estudantes. O risco desta proposta, portanto, é não dialogar efetivamente com os princípios republicanos tratados no início deste texto.

Na parte 2 desta reflexão, buscarei apresentar a experiência de tempos eletivos em andamento nas escolas de tempo integral do Ceará, uma outra perspectiva de diversificação de itinerários.


Texto escrito por Rogers Mendes com a colaboração de Hylo Leal.

terça-feira, 25 de outubro de 2016

A formação de professores a partir do protagonismo docente

A profissão de professor é uma das mais complexas. Todos concordamos. Mas temos dúvidas sobre a melhor forma de apoiar o trabalho docente de modo a fortalecer as práticas em sala de aula e a proporcionar a melhor estratégia de formação contínua, em serviço.

A formação inicial, a da universidade, é muito importante. Os conceitos basilares de cada componente curricular que devem ser ensinados aos alunos da educação básica são aprendidos na academia e servem de referência para o trabalho na escola.

Mas por melhor que tenha sido a formação acadêmica do professor, o contexto das constantes renovações tecnológicas, as mudanças nas expectativas dos jovens sobre a escola, exigem um constante repensar sobre os conteúdos do currículo e sobre as metodologias de ensino utilizadas.

A partir dessas reflexões iniciais, não tenho dúvida que para o fortalecimento do trabalho docente, três aspectos merecem destaque:

a) é preciso fortalecer o trabalho coletivo na escola. Muitos professores se sentem solitários nas definições do que e de como ensinar. Nessa dimensão, é importante proporcionar encontros semanais, pelo menos por área do conhecimento, onde os professores se reúnem para discutir sobre planos de ensino e para compartilhar experiências. Uma prática pouco comum no Brasil e que poderia ser muito útil para o fortalecimento da prática docente é o planejando cooperativo de algumas aulas pelos professores que lecionam a mesma disciplina. Essa prática permitiria que um professor desenvolvesse a aula e seus colegas pudessem assistir em sala com os alunos. Dessa experiência, seria possível uma discussão consistente sobre as estratégias pensadas coletivamente tendo como objetivo estabelecer o vínculo profissional entre os professores, a corresponsabilidade. Assim, o momento coletivo não ficaria apenas no planejamento, mas teria o contexto da prática para embasar os estudos e reflexões.

b) é importante que os professores consigam sistematizar algumas experiências desenvolvidas em sala de aula. Essa dimensão está relacionada a capacidade do professor de olhar para sua experiência e escrever sobre ela, de forma crítica, considerando acertos e limitações no desenvolvimento de alguns temas e métodos de ensino. Dessa experiência, os professores poderiam produzir artigos científicos. Esse trabalho criaria insumos para as conversas entre os pares além de se tornar uma fonte de estudo para os novos professores e, quem sabe, "material didático" para os cursos de licenciatura nas universidades.

c)  formação contínua na própria escola. Não há um locus mais adequado para a formação contínua de professores que a própria escola. É neste espaço em que as aulas acontecem, e nele também devem ocorrer os encontros formativos dos docentes. Instituir a cultura da formação entre pares é o ápice do protagonismo docente, baseado na alternância de responsabilidades dos professores nos momentos de estudo. É, sem dúvida, a estratégia mais consistente de formação em serviço e teria como pano fundo o planejamento cooperativo de aulas e o estudo dos artigos produzidos pelos professores.

As Instituições de Ensino Superior têm uma função preponderante na formação dos professores, tanto nas graduações como nas pós-graduações. Mas o que quero enfatizar é o potencial que há na escola quando esta instituição se vê como impulsionadora do aperfeiçoamento do trabalho dos professores.

O que está em pauta nesse artigo é o protagonismo docente. O bom ensino requer dos professores o envolvimento com a pesquisa, com a produção intelectual. A escola precisa se transformar numa teia de aprendizagem, em que alunos e professores estejam mergulhados no universo das descobertas e produções de conhecimento.

sábado, 15 de outubro de 2016

Professor é profissão e Educador é missão

O título desse artigo é um trecho de uma fala atribuída ao professor Salomão Becker, durante o primeiro ato de comemoração alusiva ao Dia do Professor no Brasil, num colégio paulistano, em 1947, e diz  muito sobre essa atividade.

Ao mesmo tempo que desenvolvemos uma profissão, uma das mais dignas, também nos envolvemos numa missão de educar crianças, jovens e adultos, além das competências cognitivas, pois é praticamente impossível um professor não se envolver emocionalmente com os estudantes no processo de ensino e aprendizagem, e, portanto, assumimos a missão de educador em sua dimensão mais holística.

Apoiar a carreira docente é um dos grandes desafios na atualidade. É importante encontrar formas de incentivá-los a se desenvolverem nessa profissão, possibilitando formação inicial e contínua adequada, além de garantias de financiamento para elevar suas remunerações.

Do trabalho dos professores, considerando o contexto de complexidade da sociedade moderna, pós-industrial, criou-se elevada expectativa do trabalho docente, pois está posta a necessidade de educar nossas crianças e jovens de modo que a formação escolar esteja articulada com os novos tempos. E, nesse sentido, professor motivado é essencial.

Ao lado de alunos entusiasmados com os estudos estão professores com olhos brilhando, com grande satisfação por terem contribuído com o desempenho escolar. A boa aula é responsável em grande medida pelo empenho dos estudantes. Todos temos em nossas lembranças o professor ou a professora que influenciou decisivamente nossas escolhas acadêmicas ou profissionais.

No Ceará, nossos professores merecem o reconhecimento da sociedade por grandes conquistas realizadas na educação pública. Vejamos:

a) Nossos índices de alfabetização chegaram aos patamares dos Estados mais desenvolvidos da federação, elevando significativamente o Ideb;

b) No Enem, a partir de um trabalho desenvolvido pelos professores nas escolas, 98% dos alunos se inscreveram em 2016 para fazer as provas, manifestando a confiança que os estudantes têm num futuro mais próspero e no trabalho levado a sério pelos docentes na formação dos jovens;

c) Na iniciação científica, temos cada vez mais alunos envolvidos em projetos científicos, orientados por professores, e que concorrem em feiras nacionais e internacionais;

d) O percentual de alunos que abandonaram as escolas públicas estaduais no ensino médio foi drasticamente reduzido de 2007 a 2015, saindo de 16,33% para menos de 7%. Redução de mais da metade deste indicador.

Não há dúvida de que os resultados alcançados pelo Estado nos últimos anos se devem ao trabalho árduo dos docentes cearenses. Dessa forma, a todos os professores das escolas públicas, nossa sincera homenagem.

Publicado no jornal O povo, 15 de outubro de 2016.
http://www.opovo.com.br/app/opovo/opiniao/2016/10/15/noticiasjornalopiniao,3664193/professor-e-profissao-e-educador-e-missao.shtml

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Protagonismo Docente: a escrita acadêmica e literária fortalecem a prática em sala de aula

Não tenho dúvida. O professor que escreve sobre suas experiências e publica artigos científicos, ou que tem uma veia artística e escreve belas histórias ficcionais, poemas, contos e afins, amplia seu repertório didático, consolida novas aprendizagens e se torna um profissional mais vigoroso, orgulhoso de sua produção e do seu trabalho docente.

Paulo Freire afirmava: "Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino". O trabalho de professor não pode se distanciar do processo de busca por novos saberes, novas descobertas. Dar uma aula tendo como referência um trabalho autoral é diferente, dá segurança e promove a educação dos alunos pelo exemplo.

Por essa razão, é muito importante apoiar o trabalho de pesquisa e escrita criativa dos professores como parte integrante de qualquer política de formação contínua. Trata-se de uma dimensão denominada por estudiosos da área de "autoformação".

Nesse mês de outubro de 2016, a Secretaria da Educação do estado do Ceará lançou duas iniciativas nessa direção que apoiarão e incentivarão professores a se engajarem ao universo das pesquisas científicas e na criação de obras literárias: Revista DoCEntes e Edital para seleção de produções acadêmicas ou literárias para publicação de livros.

A Revista DoCEntes terá circulação quadrimestral e será um periódico para publicação de artigos escritos por professores. Será uma grande oportunidade para os docentes que desenvolveram dissertações ou teses publicarem suas reflexões, mas acima de tudo, será um estímulo aos professores que não têm o hábito de produzir trabalhos científicos a iniciar um processo de sistematização de seus saberes práticos e compartilhar na revista seus achados e suas conclusões.

Noutra frente, foi lançado o primeiro edital que selecionará produções acadêmicas e literárias de professores para publicação de livros. Será um reconhecimento da qualidade da produção científica e artística dos educadores cearenses. Teremos a partir de agora, muitos livros nas estantes das bibliotecas escolares de autoria de nossos mestres.

Apoiar o protagonismo docente fortalecerá a adesão dos professores à proposta educacional desenvolvida nas escolas, proporcionando a qualificação do processo ensino e aprendizagem.

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

O ensino médio e as medidas provisórias

Estamos diante de um desafio: melhorar a qualidade da escola de ensino médio. Este desafio está claro!

Todos sabemos que nesse nível de ensino, há uma cobrança mais intensa da sociedade, pois se trata do último nível da educação básica, e muitos jovens, ao concluir, não desenvolveram o domínio das dimensões cognitivas adequadas ou pior, não conseguem nem mesmo chegar ao final, ficando pelo caminho devido a sucessivas reprovações e desestímulo, na maior parte das vezes, ainda no ensino fundamental. E essa constatação para uma nação que almeja um futuro melhor, é trágica!

O currículo do ensino médio precisa de mudança? Tenho convicção que sim. É importante melhorar o clima escolar, a partir da sistematização de um projeto pedagógico que dialogue bem com as juventudes, seus anseios e projetos de vida, possibilitando diferentes itinerários formativos.

Mas mudanças em uma cultura cristalizada de ensino não se dá por Decreto, ou melhor, por Medida Provisória. Qualquer turbulência em que não se pode prever as consequências coloca em xeque a credibilidade de quem as propõe perante a comunidade escolar. O sentimento de responsabilidade é irrevogável.

As redes de ensino que já se arriscaram a implementar algumas mudanças no currículo do ensino médio, tão somente utilizando todas as oportunidades que a LDB já dispunha, como é o caso da rede estadual do Ceará, com a implantação do Núcleo Trabalho, Pesquisa e Práticas Sociais (NTPPS), componentes curriculares eletivos e o tempo integral, podem testemunhar que mudanças dessa natureza requerem diálogo, formação contínua de professores e consistência pedagógica dos novos caminhos.

Não podemos pôr em risco o futuro de uma geração com aventuras em massa, não testadas amplamente e avaliadas quanto aos seus efeitos.

Estamos prestes a assistir no Brasil, com a recente Reforma do Ensino Médio proposta pelo MEC, de forma aligeirada e sem acúmulo nacional de consensos, um grande mal estar, com a sensação de mudanças sem contexto.

O Ministério conseguiu colocar no mesmo conjunto de normas que almejam mudanças no currículo, com um novo horizonte de tempo para a jornada escolar, flexibilizações bruscas nas rotinas de contratação de professores, que pode dominar a pauta das discussões dos próximos dias e esconder as reflexões possíveis sobre o desenvolvimento de um currículo que responda aos desafios do ensino médio.

Tipo de Erro que os mais apressados sempre cometem!

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Qualidade e equidade nas séries iniciais do Ceará

No último 8 de setembro, o MEC divulgou o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) calculado a partir da Prova Brasil e Saeb aplicado em 2015. Trata-se de um índice que sintetiza dois indicadores: 1) desempenho acadêmico dos alunos em linguagem e matemática e 2) taxa de aprovação.

Ao analisar o desempenho dos municípios do Ceará nesse índice, nas séries iniciais, pode-se destacar alguns elementos importantes:

a) o Ceará foi o único estado da federação em que todos os municípios alcançaram a meta projetada para 2015;

b) dos 183 municípios que tiveram Ideb calculado, 68 já têm índice superior a 6, representando 37,2%. Em Pernambuco, estado do Nordeste com características parecidas com a do Ceará, 8 municípios conseguiram esse índice, 4,4% do total;

c) no 5º ano, em Língua Portuguesa, a diferença da média de proficiência dos alunos no quintil mais alto do índice socioeconômico em relação ao quintil mais baixo é de apenas 0,3 pontos. Já na Matemática, os alunos mais pobres se saíram melhor, com 7 pontos a mais na média.

Isso quer dizer que a escola pública cearense vem conseguindo desenvolver aprendizagem para todos, na busca constante da equidade. Enquanto nos demais estados da federação a diferença econômica afeta consideravelmente o desempenho acadêmico, onde os alunos com condições socioeconômicas melhores tiram notas mais altas, no Ceará essa diferença é praticamente nula.

Esses resultados têm grande relação com o Programa de Alfabetização de Idade Certa (Paic), que é feito em parceria com os municípios cearenses. Desde 2007, a Seduc apoia os municípios na definição das orientações curriculares, material didático e acompanhamento das redes de ensino.

No fim de 2015 o governo lançou o Programa de Aprendizagem na Idade Certa (Mais Paic), que expande os critérios de distribuição do ICMS e a premiação do Escola Nota 10 para os Anos Finais do Ensino Fundamental. A formação de professores para essa etapa também foi contemplada e já está em prática a partir de 2016. Espera-se que, com a expansão do programa, os resultados impressionantes dos Anos Iniciais cheguem à etapa final do Ensino Fundamental e, posteriormente, ao Ensino Médio.

O Ceará, é possível afirmar diante dos dados, vem conseguindo consolidar uma rede pública de educação, onde todos os municípios vêm respondendo positivamente aos estímulos institucionais propostos pela Secretaria da Educação. Isso porque o Governo do Estado, numa decisão pioneira no Brasil, resolveu apoiar as gestões municipais com investimentos e assistência técnica, quebrando o paradigma de que o Estado é responsável apenas por sua rede de escolas.


Lucas Fernandes Hoogerbrugge
lucas.fernandes@seduc.ce.gov.br
Coordenador de Cooperação com Municípios (Seduc-CE)

Rogers Vasconcelos Mendes
rogers@seduc.ce.gov.br
Coordenador de Gestão Pedagógica (Seduc-CE)

Publicado no Jornal O POVO no dia 12 de setembro de 2016. Clique AQUI

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Lições da sala de aula: Educação Republicana tem como princípio a inclusão e a cooperação

Na educação pública, a competição não é um bom caminho. A meritocracia encontra muitos limites num contexto de intensa manifestação de desigualdade no acesso à oportunidades.

Sei que a sociedade embriagada no espírito do capitalismo, baseada no lucro e no primeiro lugar,  eleva bastaste o grau da competição nas relações sociais e institucionais. Sempre é enfatizado os que "conseguem", os melhores. Para estes, a glória!

Todos os cidadãos e as instituições que ficam depois do primeiro lugar sentem-se motivados(as) para vencer na próxima? A constante exclusão ou rebaixamento nos muitos rankings possíveis é uma boa estratégia para motivação das escolas em larga escala? Dentro da sala de aula, a não atenção aos que não manifestam interesse no momento é mesmo justificável?

Ora, "o sol nasce para todos, logo todos são capazes e têm as mesmas oportunidades!" Dizem os que respondem "sim" a estas perguntas. Há quem responda "em algumas situações" é necessário aplicar a meritocracia, pois a escola não pode ser uma ilha e precisa adequar-se as estruturas da sociedade competitiva que se consolida. E os que respondem "não" baseiam-se nos princípios de uma escola não reprodutivista, emancipadora.

A pedagogia do "ninguém para trás" deve ser a premissa nas escolas públicas. A ausência dessa premissa compromete o desenvolvimento da função social da instituição escola e reforça a lei da selva urbana: "cada um por si, Deus por todos".

Na sala de aula e nas relações de rede entre as escolas, é importante que a cooperação seja a regra. E para ter cooperação tem que ter partilha de experiências e a concretude do interesse em corresponsabilizar-se.

O filme "Escritores da liberdade", de 2007, inspirado em uma história real, caricatura o que quero expressar nesse texto. Nessa obra, as lições aprendidas são:

a) não há educação verdadeiramente inclusiva quando a vida de cada sujeito não for tema das aulas;

b) turmas "especiais" para os que não conseguiram aprender no tempo esperado reforça a exclusão;

C) os sentimentos devem fazer parte da agenda escolar, desprezá-los não é sensato.

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Lições da sala de aula: o desafio de envolver todos os alunos no processo de aprendizagem

As salas de aula são constituídas de alunos com características muito diferentes, ritmos de aprendizagem distintos, com desenvolvimento cognitivo específico, e o mais importante: com expectativas bem peculiares sobre a escola.

Diante dos múltiplos interesses, como estruturar o projeto pedagógico da escola e as aulas de modo que todos sejam envolvidos no processo de aprendizagem?

Esse desafio, a meu ver, tem duas dimensões: a) redimensionamento da proposta pedagógica da escola com a inclusão de tempos eletivos, que permitam itinerários formativos diversos; e b) aulas planejadas com vistas a garantir a participação de todos.

Na primeira dimensão, sobre o redimensionando do projeto pedagógico, creio que a escola não pode ser hierárquica e autoritária na definição de um único itinerário formativo, com tempos rígidos para cada componente curricular. Desse jeito, a mensagem subliminar que se passa é a seguinte: se quiser estudar e conseguir êxito nos estudos, a "única" opção é passar por essa trilha. Existe uma outra opção, claro, abandonar a escola.

Por que é tão difícil criar um movimento de pensar a escola para se respeitar os projetos de vida de cada sujeito? Talvez porque a lei do menor esforço prevaleça e se dê preferência para o que já é praticado desde as primeiras escolas. Enfim, é preciso discutir com seriedade essa questão chave para a reestruturação do ensino médio.

A segunda dimensão, relacionada a questão das estratégias didáticas nas aulas, é um processo que deve ser melhor estruturado. Diante da variação de interesses e ritmos de aprendizagem, é importante que cada um dos estudantes seja envolvido com a proposta da aula. Destaco duas estratégias: aprendizagem cooperativa e desenvolvimento de pesquisas científicas.

A aprendizagem cooperativa é, mais do que qualquer definição pedagógica, uma crença que a cooperação é mais importante num processo educativo que se quer equânime que o estímulo a competição. Assim, educar as crianças e jovens a estudar com seus colegas, desenvolvendo a dimensão protagônica e proativa dos alunos em sala de aula, é uma escolha associada ao desafio de não deixar ninguém para trás.

O estímulo à pesquisa científica, por sua vez, é a forma de desafiar cada estudante a elaborar suas próprias perguntas sobre um tema de estudo e desenvolver, a partir do método científico, uma trilha de descoberta de novos conhecimentos. Sim, acredito que a pesquisa científica pode ser instrumento de aprendizagem na educação básica, com total possibilidade de consolidar-se como princípio pedagógico.

Todas essas dimensões não se tornam realidade de repente. É necessário discussões e planejamentos consistentes para que tenhamos uma escola mais inclusiva.

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Lições da sala de aula: a afetividade entre professor e alunos cria clima favorável à aprendizagem

Há muito se discute o conceito de profissionalização docente numa perspectiva de afastar a imagem do tio e da tia da sala de aula. Esse truque para tranquilizar crianças a irem assiduamente para a escola precisa ser superado, mas não pode restringir a ação docente a "dar o conteúdo" imparcialmente, sem envolvimento emocional com os estudantes.

A relação em sala de aula dos seus sujeitos não pode ser fria, baseada apenas na técnica didática. A sala de aula cria inevitavelmente vínculos sociais que marcam nossas principais lembranças da infância e juventude. Lembramos sempre dos professores que foram capazes de nos olhar nos olhos e transmitir sinceridade e preocupação com o rumo que estávamos tomando com nossas escolhas.

Não é banal ou perca de tempo abrir espaço na aula para conversar sobre futuro, novas perspectivas. Não me refiro a ministrar conselhos, não é disso que estou falando e não a recomendo, mas estimular os sonhos que energizam os projetos de vida.

Para uma educação plena, integral, é preciso desenvolver a aprendizagem acadêmica e as competências socioemocionais. Desassociar estas duas dimensões fragiliza a proposta pedagógica da escola pública.

Em sala de aula, sempre busquei me mostrar aberto para escutar as angústias, anseios e, principalmente, as esperanças dos jovens, suas visões de futuro. Mais que uma ação de apoio a eles, era para mim uma forma de identificar o que de fato era importante para se trabalhar nas aulas, permitindo a contextualização dos conteúdos ao imaginário, ao por vir. Entendia que a cada aula, mais do que uma aprendizagem nova, devia ser fortalecido a esperança de uma vida melhor. Tratar os conteúdos sem essa conexão, amplia as chances de uma aula sem envolvimento dos estudantes.

Mais recentemente, algumas iniciativas estão sendo induzidas nas escolas estaduais do Ceará, como o projeto Professor Diretor de Turma; o Núcleo Trabalho, Pesquisa e demais Práticas Sociais; e Aprendizagem Cooperativa. Todas elas tem algo em comum: buscam fortalecer entre professores-alunos, alunos-alunos, os vínculos emocionais a partir da socialização das histórias de vida, do fortalecimento das relações solidárias e do desenvolvimento das competências socioemocionais.

Longe de querer substituir a agenda escolar, dando mais ênfase a dimensão emocional, quero apenas destacar que sem um clima escolar acolhedor, capaz de dar esperança aos jovens de encontrarem pela escola sentido para suas vidas, o sucesso acadêmico pode não ocorrer para uma parte significativa dos estudantes.

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Aos estudantes, toda a atenção e respeito

No dia 11 de agosto, comemora-se o dia dos estudantes. Na oportunidade, além de comemorar, é preciso refletir sobre as novas necessidades desses sujeitos que estão nas escolas públicas, em busca de garantir a cidadania plena.

Questão 1: as condições necessárias para que crianças e jovens entrem e permaneçam na escola estão garantidas?

Essa questão não passa apenas pelas estruturas escolares. A sociedade e as instituições governamentais e da justiça precisam criar uma rede de proteção das crianças e jovens com o objetivo de promover acesso e permanência à escola. O que ainda, infelizmente, não ocorre em sua plenitude no Brasil, pois se tolera casos de trabalho infantil, desistência da escola, envolvimento com drogas muito precocemente e outras mazelas. Tem que ser rigoroso na garantia de direitos fundamentais.

É preciso avançar nesse quesito para que a escola se concentre efetivamente em promover o sucesso acadêmico.

Questão 2: A escola está sintonizada com as características dos "novos" jovens?

Falo de escola sintonizada com "novos" jovens ao pensar na seguinte frase que se ouve comumente dos adultos: "no meu tempo, os estudantes eram mais comportados e aprendiam o que se ensinava."

Mesmo dando desconto ao exagero desta afirmação, é preciso considerar que hoje os estudantes se socializam numa rede mais dinâmica de relações, em que se garante a fala desde muito cedo às crianças na família, e os recursos tecnológicos utilizados no sistema de comunicação é muito mais rápido e intenso. Mas a escola é muito parecida.

Essas duas mudanças são suficientes para justificar todas as iniciativas das escolas em se adequar às novas necessidades dos estudantes.

As aulas, com crianças que não toleram ficar em silêncio, precisam ser mais participativas. E com as novas linguagens e intensificação do uso de tecnologias para estabelecer comunicação a todo instante, há necessidade de um maior dinamismo no processo de ensino e aprendizagem.

Não é possível que apenas se exija dos estudantes mais atitude, é necessário que se ofereça melhores condições de educação.

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Lições da sala de aula: o bom planejamento contribui muito para a boa aula

Quando a aula é estruturada no repasse de informações, na educação bancária, e não para proporcionar aprendizagem efetiva, o planejamento do professor pode se resumir a estudar o conteúdo do dia.

Nesse caso, planejamento é uma preparação do professor para ministrar o conteúdo, geralmente de forma expositiva com a previsão de se passar alguns exercícios para os alunos "fixarem a matéria".

Esse procedimento não parece suficiente diante dos novos desafios colocados para a educação, com jovens em sala de aula mais propensos a se dispersarem por estarem habituados a um sistema de comunicação muito mais dinâmico, versátil.

Na geração que escrevia carta, uma vez ou outra, ouvia rádio e assistia televisão assiduamente, havia mais tolerância a exposições ininterruptas, pelo menos em tese. Na geração que a todo momento é um "flash" nas redes sociais, que gosta de textos curtos, de preferência acompanhados de imagens, que assiste vídeos com até 5 minutos de duração, o tempo excessivo de uma exposição de conteúdo pode ser uma estratégia ineficiente.

Nos meus textos, faço sempre críticas a aulas expositivas. Antes de continuar com a reflexão sobre planejamento, quero apenas esclarecer que acho necessário que o professor faça explanações sobre o tema. O ponto que chamo a atenção sempre é o excesso dessa estratégia.

Em oposição a tudo isso, quando o propósito da aula é ampliar as possibilidades dos estudantes de aprenderem o que está programado, o planejamento da aula requer mais atenção do professor, pois a sistematização das estratégias didáticas e sua variação torna-se fundamental.

Percebi na minha experiência que alguns aspectos são básicos no momento do planejamento, faço a seguir menção a três:

1) o tempo de concentração médio dos jovens para realização de uma atividade, como ouvir o professor, fazer um trabalho em grupo, resolver situações-problema é de aproximadamente 15 minutos. Assim, o planejamento da aula deve prever novas atividades nesse tempo. Variar o repertório e o tipo de estímulo é essencial para manter os estudantes envolvidos com a proposta de aprendizagem. Ou seja, é preciso ter clareza sobre a sequência didática.

2) toda aula tem que ter um objetivo de aprendizagem claro, ao qual os estudantes tem plena consciência, e que precisa ser alcançado no tempo disponível. Deixar para concluir depois, na próxima aula, não é recomendado. Portanto, tratar os conteúdos numa lógica do constante, é um convite à dispersão da atenção.

3) a aula deve ter começo, com a apresentação do objetivo e retomada dos principais itens da aula anterior; um meio, que é o desenvolvimento da sequência didática; e um fechamento, que pode ser a síntese e avaliação.

Com o planejamento realizado nesses parâmetros, a aula tem mais chance de se desenvolver com tranquilidade e com melhor aproveitamento do tempo pedagógico.

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Lições da sala de aula: avaliar para aperfeiçoar a prática docente

É tentador usar o processo de avaliação da aprendizagem como instrumento de manutenção da ordem e progresso em sala de aula. Não resisti a provocação!

Para muitos professores é inadmissível a inexistência de um processo de avaliação da aprendizagem rigoroso, com provas e aplicação de outros instrumentos de aferição do domínio do conteúdo estudado pelos alunos. Sem o mesmo, nessa tese, os alunos não dão a atenção devida às aulas, principalmente expositivas.

Quem nunca ouviu: preste atenção que isso pode cair na prova. Ou, depois que se darem mal na prova, não digam que não avisei. São frases geralmente utilizadas em momentos de indisciplina ou de dispersão da atenção.

A questão é que afirmativas como essas distorcem o objetivo da escola. O estudante não deve se esforçar apenas para se sair bem nas provas, isso limita as intenções educativas, tornando-a sacal e desconectada do seu propósito mais nobre: o de promover a emancipação intelectual.

Nesse contexto, avaliar não deve ser fim em si mesma, mas um meio para melhorar o processo de ensino e aprendizagem. Percebi nas primeiras aulas que ministrei que avaliar não pode ser sinônimo de punir. Não tenho nada contra a aplicar instrumentos avaliativos como testes. Pelo contrário, acho necessário. Sou contra a não dar a devida atenção a elaboração dos instrumentos aplicados e a utilizá-los sem o propósito de diagnosticar o processo de aprendizagem.

Um instrumento ruim gera informações igualmente ruins. Um teste, por exemplo, não pode ser apenas uma compilação de questões sobre os assuntos estudados e o resultado não deve ser apenas uma nota de 0 a 10. Cada questão apresentada deve ter uma análise independente, até para identificar o quanto do desempenho acadêmico se deve a forma como a pergunta avaliativa foi elaborada. É um grande equívoco considerar qualquer instrumento absoluto. Podem ser falhos e precisam ser questionados sempre pelo professor e pelos estudantes.

Esses instrumentos, em última análise, precisam gerar informações sobre as dificuldades dos estudantes com a perspectiva de se propor intervenções pedagógicas que consigam dialogar com a situação diagnosticada. A ausência dessa percepção faz com que o ato de avaliar fique sem sentido.

Mas além dessa visão, a didática adotada para conduzir ao conhecimento de um tema estudado precisa passar também pelo crivo crítico. A avaliação em sala de aula também deve servir para compreensão da eficácia da didática utilizada, sempre na perspectiva de aperfeiçoar a prática docente.

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Lições da sala de aula: associar o que se estuda ao que se vive

Escola tem uma função social bastante controversa. Para muitos é uma instituição que serve de instrumento para reprodução do conhecimento, memorização dos grandes feitos da humanidade, de acomodação às estruturas opressoras e por aí segue. Para outros, é um espaço de construção de um conhecimento inacabado, de rupturas, consolidação de um sistema de escolhas no contexto de uma sociedade democrática.

Essas duas visões coexistem no cotidiano das escolas. Parte do tempo letivo é destinado à estudar os conteúdos do livro didático. Quanto a isso, nenhum problema. A limitação que vejo é o ensino ficar restrito a essa fonte, sem trazer as correlações com a vida dos estudantes.

Para ilustrar o que estou afirmando, o tema água, quando estudado na escola, é abordado de forma geral, mais próximo de um conceito abstrato. É essencial para a vida, por isso deve ser preservada! E parece que para por aí.

Mas ficam no ar algumas perguntas: quantos dos alunos sabem de onde vem a água que chega a torneira das casas? A fonte de onde vem a água aguentará até quando tendo em vista a escassez de chuvas, principalmente no nordeste? Como é feito o tratamento? Que estratégias já foram pensadas e que podem ser implantadas para convivência com o Semiárido? Como se dá a resolução ou gestão de conflitos sociais gerados pela disputa da água? Como são garantidos os direitos essenciais? Há riscos de contaminação dessa água?

Essas perguntas não são banais. Lecionei numa escola encravada no sertão cearense. No Semiárido em sua expressão mais evidente. A comunidade de cerca de 12 mil habitantes é abastecida com água armazenada num açude com capacidade de 24 milhões de m³. Há um sistema de tratamento com filtro e adição de produtos químicos.

Meus alunos, com quase 10 anos de escolaridade, nunca tinham sido apresentados ao processo de captação da água e a todo o processo de tratamento. Não imaginavam por quais procedimentos a água passava antes de chegar às suas casas.

A vida moderna gera facilidades que nos desconectam da natureza. Os recursos naturais são temas constantes na sociedade devido a escassez ou utilização indevida. E isso precisa ser pauta constante no processo de ensino.

O mais grave, na minha concepção, os jovens não imaginavam os conflitos existentes por conta da disputa pelo acesso e uso da água. Sim, disputa! Todo reservatório é a barragem de um ou vários rios. Os moradores pós barragem esperam que a água seja liberada ao longo do ano. Criadores e agricultores dependem dessa água também. Mas a população da sede, quando sente a escassez de chuvas, protesta pelo fechamento das comportas, e aí inicia um embate que muitas vezes gera tensões sociais.

Enfim, água é muito mais que uma fórmula química ou uma fonte vital para a sobrevivência. Os estudantes  precisam ser instigados a enxergarem e compreenderem sua realidade para viverem a plenitude da cidadania.

Esse é apenas um exemplo, de muitos outros temas estudados na escola e que tem relação direta com a vida dos estudantes e, por isso, poderiam ser melhor trabalhados a partir da contextualização com a vida real.

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Lições da sala de aula: ter altas expectativas sobre os alunos faz a diferença

Quando comecei a lecionar nas séries finais do ensino fundamental e ensino médio, início dos anos 2000, a universidade não fazia parte nem de longe dos sonhos dos jovens. De fato eram poucas as oportunidades. Concluir o ensino médio parecia ser um feito bem expressivo frente a baixa escolaridade dos pais. O projeto de vida de cada aluno era muito tímido.

A pergunta que me fazia nesse momento era: o que fazer diante de jovens que não trazem de casa grandes expectativas quanto ao futuro acadêmico?

Esse período foi de grande aprendizado. Falar de futuro com estudantes que não tinham grandes expectativas em mente era um grande desafio. Como professor, pensava, era importante criar um clima de otimismo quanto ao que viria a ser na complexa vida desses jovens numa sociedade moderna, pós-industrial.

Nesse cenário, adotei algumas estratégias, que agora compartilho:

1-) Falar de projeto vida, de escolhas no presente que afetam o futuro, não era tema transversal. Era o preâmbulo das minhas aulas. Antes de qualquer matéria, o sonho de uma vida acadêmica de êxito e de esperança era instigado.

2-) Sempre quando possível, estendia minhas aulas por 10 ou 20 minutos após o toque final, numa sexta-feira, depois das 17h30. Era uma estranheza só por parte dos alunos. Mas queria mostrar que sonhar é bom. Mas realizar expectativas tem custo, requer dedicação.

3-) Estimulei o quanto pude o olhar para a realidade que os cercava. Para mim, ainda acredito, escola é lugar de transformação da sociedade. Nada mais estimulante que crer na força de cada um para construir um mundo melhor.

4-) Criar o clima de nenhum para trás é essencial. Não tem ensino de qualidade onde há exclusão. A primeira reação do jovem é querer desistir frente aos desafios postos. Mas se eles se sentirem apoiados, não há quem os segure.

Hoje olho para meus alunos das primeiras turmas que lecionei e vejo que muitos embarcaram em seus sonhos e conseguiram acesso à universidade. Muitos são professores da escola onde estudaram. E pelo que sei, são ótimos profissionais.

quinta-feira, 28 de julho de 2016

Lições da sala de aula: a primeira experiência

Quando iniciei minha vida de professor, ainda aos 18 anos, recém ingresso na universidade no curso de ciências sociais, lecionava numa sala de "aceleração", programa do governo do estado do Ceará na década de 1990 que pretendia corrigir fluxo, uma vez que na importante campanha de garantir a matrícula das crianças na educação básica, muitas já tinham uma idade avançada quando se matricularam pela primeira vez e com processo de alfabetização incompleto.

A intenção do programa era dar condições as crianças e jovens a se adequarem as séries indicadas para suas idades. Pela complexidade da missão, essa primeira experiência foi certamente a minha grande sala de aula, onde pude sentir toda a diversidade de ritmos de aprendizagem. Um desafio marcante!

Nas minhas reflexões sobre escola pública, essa vivência surge sempre como ponto de partida. Lembro das expressões dos meus alunos durante as atividades propostas, em que se revelava a timidez e a consequentemente dificuldade de comunicação.

Aprendi nesse período algumas lições:

1) Não tem como fugir. O mesmo assunto tem que ser abordado de forma diferente em sala de aula. A aula expositiva é útil para alguns, mas muitos somente conseguem aprender quando se envolvem em atividades de grupo, com metodologia participativa. Outros ainda precisam de atendimento individualizado. Numa perspectiva de aula inclusiva, é preciso variar os métodos de ensino de modo a envolver todos os alunos no processo de aprendizagem.

2) A aula tem que ter contexto. Como abordar um assunto sem partir de uma situação real ou resolução de um problema posto para a humanidade? Todo conhecimento foi desenvolvido a partir de uma necessidade humana. Então tem o por que de ter sido desenvolvido. Colocar para os alunos temas que não se sabe ao certo a necessidade de estudá-los, dificilmente traz o estudante para o circuito de atividades da sala de aula.

3) O tempo em que alunos de mantêm concentrados na mesma atividade não é tão elástico. Permanecer muito tempo numa mesma proposta é um convite para a dispersão da atenção e do interesse. O professor precisa estruturar suas aulas de modo que suas intervenções tragam elementos novos para os estudantes se manterem concentrados.

4) Mais importante que o método de ensino, é  a capacidade do professor de conquistar a confiança dos alunos. Como assim? Os alunos precisam confiar que o professor está verdadeiramente envolvido com o sucesso acadêmico. A partir deste vínculo, as propostas de aprendizagem terão o envolvimento mais consistente dos alunos.

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Professor não é repassador de conteúdos

Não há imparcialidade ou neutralidade plena em nenhuma situação relacionada ao processo de ensino. A história de vida de cada professor se manifesta involuntariamente em qualquer expressão dos conteúdos programados. E ainda bem que é assim. O contrário seria memorização do que se lê e escuta para passar nas provas.

Não é sensato restringir o ato de educar a um mero formalismo de apropriação de conteúdos historicamente construídos e que, justamente pelas inúmeras interpretações manifestas nos diferentes livros didáticos, precisam passar por um amplo processo de reflexão. E a experiência do professor é indispensável nesse momento. Sem ela, o risco de se distorcer muitas informações é extremamente elevado.

Não dá para coibir o pensamento crítico do professor sem prejudicar àquilo que verdadeiramente caracteriza a boa aula: as relações de confiança e afetividade que se estabelece entre o docente e seus alunos.

Muito tem me incomodado nas discussões recentes sobre qualidade educacional, no contexto dos princípios da escola sem partido, a estreiteza do pensamento de que apenas a definição dos conteúdos e dos métodos de ensino são suficientes para se ter a aula adequada, efetiva. De preferência, sem questionar muito o autor dos livros didáticos ou apostilas dos sistemas de ensino. O que a elite quer dizer nesses instrumentos deve ser a única verdade.

Sim. Todos sabemos que as obras didáticas vez ou outra trazem informações esquisitas com a finalidade de criar um clima de confirmação do status quo e manutenção da conformação diante das condições postas em nosso país. Isso sim, é doutrinação. Essa novela é um remake do período nebuloso de nossa história que se quer superar.

Se reivindica um professor neutro, que não se envolva emocionalmente com aquilo que ele estudou e estuda. Exige-se, apenas, o repasse dos conteúdos, de forma fria e sem nenhum tipo de manifestação outra que não seja a do texto do livro didático.

Alguém percebe que o que se quer, a todo custo, é a oficialização da educação bancária, tão denunciada por Paulo Freire?  Uma educação alienadora, em que deve se acreditar sem refletir no que é trabalhado em sala de aula?

Ao professor, basta dar aula, garantir que o aluno aprenda o conteúdo, sem discussão, no clima: "aceite que doe menos".

Educar não é produzir um produto inanimado, como uma peça de geladeira. Envolve sentimentos, histórias de vida, o olhar sincero, confiança no potencial do professor e de seus alunos. É, acima de qualquer outra coisa, um ato emancipador.

segunda-feira, 18 de julho de 2016

As aulas das humanas e o estímulo à escrita

Sou professor de sociologia e nas minhas aulas busco sempre estimular os estudantes a escreverem. Para organizar as ideias sobre os temas estudados, não há estratégia melhor.

Umas das atividades que indico é a escrita de parágrafos sobre perguntas relacionadas ao tema da aula antes da explicação ou discussão. É a famosa sondagem sobre o que o estudante já tem de conhecimento acumulado. Essa atividade é rápida, leva em torno de cinco minutos, e traz o estudante para o tema da aula e permite o envolvimento da totalidade da classe. Quando os peço para lerem o que escreveram tenho elementos de partida para ministrar a aula em diálogo com suas ideias iniciais. A aula flui muito bem.

Saber organizar as reflexões ao escrever é uma habilidade que precisa ser estimulada cotidianamente. E as aulas de humanas podem muito bem dar essa contribuição.

Uma experiência que marcou a minha trajetória docente se deu em parceria com uma colega professora de língua portuguesa, profa. Wilma Duarte, na escola Israel Leocádio de Vasconcelos. Trabalhamos quinzenalmente temas de redação do ENEM ou de vestibulares que estavam voltados para o gênero dissertativo-argumentativo da seguinte forma:

- Eu apresentava o tema e estimulava uma discussão com os alunos, trazendo textos auxiliares para sua compreensão; 
- Noutro momento, a professora de língua portuguesa orientava sobre a organização do texto e escrita da redação;
- Os alunos então escreviam seus textos sobre o tema;
- Eu corrigia com foco na organização dos argumentos apresentados e a professora de língua portuguesa corrigia observando a organização textual;
- Com as minhas observações e da professora de língua portuguesa, os estudantes eram estimulados e fazerem a reescrita;
- Abria-se novo ciclo.

Considero essa simples experiência de resultados surpreendentes. Em dois meses de atividades percebemos o aperfeiçoamento da escrita de estudantes que não conseguiam expressar de forma coesa suas ideias neste tipo de escrita.

O que mais uma vez insisto, é que a leitura e escrita não é responsabilidade isolada dos professores de língua portuguesa. Todos os professores podem se envolver numa rotina em que a leitura e a escrita se fazem presentes.

quarta-feira, 13 de julho de 2016

Círculos de leitura na escola

A prática social da leitura e escrita precisa ganhar destaque no cotidiano escolar. É preciso superar o uso da leitura e da escrita apenas como instrumento técnico para se aprender o que as disciplinas trazem em seus conteúdos específicos.

Aprender a ler e escrever é um ato libertador. Seu uso social deve extrapolar o utilitarismo pedagógico e permitir ao estudante a interação com as situações reais vividas na sociedade e com os dilemas filosóficos da humanidade. Em outras palavras, a leitura e a escrita devem ganhar relevância para os estudantes no sentido mais amplo: o da cidadania plena.

Nesta perspectiva, quero destacar nesse texto uma iniciativa: os círculos de leitura.

Segundo o glossário Ceale, elaborado pela Universidade Federal de Minas Gerais, Círculo de leitura é uma prática de leitura coletiva e compartilhamento de textos e consiste basicamente na reunião de um grupo de pessoas, em encontros sucessivos, para discutir a leitura de uma obra literária ou não.

No Ceará, algumas escolas da rede estadual, com a orientação da Fundação Fernand Braudel e com apoio da Fundação Itaú Social, vêm desenvolvendo esta prática de envolvimento dos jovens estudantes em círculos de leitura. Nestes círculos, os participantes lêem obras clássicas da literatura mundial e participam de discussões sobre suas compreensões da leitura.

E o resultado não poderia ser outro: estudantes "magnetizados" com as tramas sofisticadas das histórias de Shakespeare e de outros gênios da literatura.

Os círculos de leitura, clubes de leitura ou algo do gênero devem ser estimulados em todas as escolas. A manifestação do protagonismo estudantil e o apoio dos professores são os ingredientes para se estruturar este tipo de iniciativa.

É muito importante que as escolas consigam ampliar seus repertórios de oportunidades de aprendizagem para garantir o sucesso acadêmico de seus alunos. E a criação dos círculos de leitura, sem dúvida, vai nessa direção.

Sugestão para consulta:

http://www.circulosdeleitura.org.br

sábado, 9 de julho de 2016

Incentivo à leitura para uma melhor escrita

Para escrever bem é preciso de três coisas, já diziam os primeiros professores: ler, ler e ler.

Hoje se faz campanhas para que o estudante escreva textos de até 30 linhas no gênero argumentativo-dissertativo para obter uma nota próxima ao ideal no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Mas não é possível escrever melhor sem o acúmulo de leituras.

Claro que para criar a prática da escrita não precisa esperar a leitura de uma biblioteca inteira. Não há uma ordem nessa questão: prática da escrita e da leitura deve se desenvolver simultaneamente.

O que quero expressar nesse texto é a necessidade de se estabelecer uma campanha permanente para se estimular a leitura na escola. O professor Edgar Linhares, ex-presidente do Conselho Estadual de Educação do Ceará, falecido recentemente, falava uma coisa que me chamava a atenção: nosso pensamento ocorre a partir de palavras, portanto, quanto maior o vocabulário do sujeito, mais longe o pensamento e a criatividade podem ir. (Essa não é uma citação ipsis verbis)

E a incorporação de palavras ao vocabulário somente é possível com a leitura de gêneros variados, das obras clássicas da literatura às obras mais contemporâneas, passando por jornais e revistas de circulação diária, semanal ou mensal. Enfim, ler, creio ser um consenso absoluto, é o subsídio para o pensamento crítico argumentativo, e consequentemente de uma boa escrita.

Porém, um entendimento que precisa ser superado é a vinculação das práticas pedagógicas de leitura e escrita às aulas de língua portuguesa. É muito pouco abrangente esse movimento na escola puxado apenas por professores dessa disciplina.

Há de se pensar estratégias que envolvam todos os professores, pois está à disposição obras da literatura ou periódicos associados a todos os componentes curriculares. Além disso, a escrita de textos é possível de ser inserida no plano de trabalho de todos os professores. Requer, no entanto, uma articulação da gestão da escola para efetivar essa possibilidade.

Enfim, a escola precisa ter como plataforma essencial de seu Projeto Político Pedagógico (PPP) o desenvolvimento do hábito de leitura de seus estudantes.

quinta-feira, 7 de julho de 2016

Liderança dos gestores no processo de aprendizagem dos estudantes

O impacto da gestão escolar nos resultados acadêmicos dos estudantes é tema bastante recorrente nas pesquisas educacionais. O quanto um grupo gestor influencia positivamente nos resultados de aprendizagem?

Sabe-se que criar um ambiente acolhedor e de altas expectativas nas escolas sobre a capacidade das crianças e jovens de aprender está entre as principais estratégias para estimulá-los a se dedicarem mais ao trabalho acadêmico. Garantir essas duas dimensões no cotidiano pode ser a grande contribuição dos gestores a partir de uma ação coordenada com todos os profissionais da escola.

Criar um ambiente em que cada aluno se sinta integrado, acolhido, não é fácil, mas é extremamente necessário. O aluno que falta a aula deve sentir, no mesmo dia, por exemplo, o quanto faz falta para a escola. Isso é básico. Mas ainda se enfrenta muitos desafios no acompanhamento e tomada de decisões quanto a infrequência discente e isso pode fortalecer uma sensação perigosa no estudante de que sua ausência não é sentida.

O que garante a inclusão educacional não é a matrícula, mas sim o cuidado sistemático que se desdobra no processo educativo de modo que seja estabelecido os vínculos afetivos dos estudantes com a sua unidade de ensino. O acompanhamento da infrequência está associada a esse cuidado. O processo de acolhimento não se esgota nessa ação, claro. Mas dizer com veemência que a escola vive a energia força do "nenhum a menos" faz muita diferença na decisão do estudante, principalmente de ensino médio, em permanecer, ou não, na escola.

Uma outra dimensão importante é a criação de um ambiente escolar fundado em altas expectativas. Não se trata de dizer aos estudantes, simplesmente, que todos são capazes de aprender. É preciso criar processos pedagógicos consistentes em que os estudantes sejam desafiados na medida certa para desenvolveram competências cada vez mais complexas.

A demonstração cotidiana dos professores de que acreditam no sucesso acadêmico dos seus alunos não é de ordem menor. Em muitas pesquisas que comparam resultados acadêmicos com as manifestações dos professores com expectativa positiva de aprendizagem de seus alunos revelam que há sim uma correlação positiva entre altas expectativas e aprendizagem efetiva.

Aos gestores escolares compete, em um última análise, fortalecer o clima escolar para que o estudante se sinta acolhido e desafiado a aprender de forma adequada.

domingo, 3 de julho de 2016

A incorporação de atividades realizadas fora da escola ao itinerário formativo do estudante

A escola é a instituição responsável pela formação intelectual/cognitiva dos cidadãos. Está organizada para trabalhar conteúdos relacionados ao vasto conhecimento acumulado pela humanidade a partir das empreitadas da ciência moderna.

Mas a sociedade contemporânea exige bem mais. Outras dimensões precisam ser desenvolvidas para ampliar as possibilidades dos jovens no que diz respeito a inserção nas estruturas complexas do mundo do trabalho, da universidade, enfim, na teia das relações pessoais, acadêmicas e profissionais.

A escola pode mudar sua organização pedagógica para adequar-se a essas novas necessidades. Trabalhar o desenvolvimento de competências socioemocionais; das habilidades artísticas e esportivas; da percepção cidadã do meu ambiente, entre muitas outras dimensões, traz para a escola novas responsabilidades e a atualiza diante dos novos desafios.

Mas a escola sozinha não pode simular todos os processos de aprendizagem nesse contexto. Criou-se muitas outras estruturas na sociedade que também contribuem para a formação das pessoas e não podem ser ignoradas na composição do itinerário formativo dos estudantes.

Não é sensato que diante desses novos desafios relacionados a formação plena das pessoas se ignore as atividades desenvolvidas fora da escola e que estão relacionadas à formação do estudante.

É importante que a escola faça um mapeamento das oportunidades de aprendizagem na comunidade para que estas possam ser reconhecidas no histórico escolar.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Oportunidades na comunidade para uma educação integral

Romper os muros da escola: eis o grande desafio. Essa ruptura exige mudança de paradigmas bastante solidificados no imaginário dos educadores, ainda.

Desde a década de 1990, quando assistimos ao maior movimento de inclusão educacional no Brasil, fala-se em derrubar os muros da escola e estabelecer um elo funcional dessa instituição com a comunidade, com a cidade na qual está situada. É o movimento de apropriação para fins educativos dos bens culturais, das práticas laborais, dos espaços de lazer e de recreação, enfim, a instituição escolar precisa expandir o conceito de sala de aula.

A escola não pode continuar sendo uma ilha na sociedade. O que acontece dentro dela não ter relação com o mundo que a cerca faz com que sua agenda seja estranhada pelos estudantes, e mais uma vez fragiliza a intenção de se contruir uma formação acadêmica significativa.

O que se aprende na escola se aprende para viver melhor na sociedade. Esse deve ser o princípio fundante do projeto político pedagógico. E viver melhor na sociedade exige compreender a complexa teia de relações que se desenvolvem na comunidade, pois esse é o livro que o estudante escreve juntamente com seus familiares e não pode ser ignorado pela escola.

Partir do que o aluno sabe é uma premissa pedagógica. Mas é preciso ir além. É preciso partir de onde o aluno vive. De suas vivências e ansiedades para melhorar suas condições de vida é que podem emanar as principais contribuições da escola na formação intelectual e cidadã das crianças e jovens.

Ainda há de se considerar que os estudantes não conhecem toda a sua cidade, sua história,  todos os bens culturais e atividades produtivas, por exemplo. Nesse caso, a escola pode proporcionar essa aprendizagem.

Estou tratando nesse texto da necessidade de construir uma escola verdadeiramente inclusiva, que dialogue abertamente com as condições sociais e econômicas de seus estudantes, com a cidade onde vivem. Esse é o contexto necessário para o processo de aprendizagem sustentável e que pode proporcionar aos alunos o entendimento da função social da escola e o sucesso acadêmico.

sábado, 25 de junho de 2016

Educação Integral

Em oposição ao entendimento de uma educação estruturada na fragmentação do currículo e exclusivamente focada no desenvolvimento cognitivo, consolida-se no Brasil o conceito de educação integral.

Esta abordagem tem em seu princípio que para formar bem crianças e jovens, no contexto da complexa sociedade contemporânea, necessita inserir na agenda escolar novos elementos pedagógicos que ampliem as oportunidades de aprendizagens para além da memorização de conceitos científicos e do desenvolvimento de habilidades e competências cognitivas.

As competências socioemocionais, a fruição das artes, a inserção dos estudantes nos temas da comunidade, entre outras frentes, devem compor o itinerário formativo na educação básica. É preciso compreender o homem como ser multidimensional, com interesses e necessidades diversas.

Educar de forma integral é ter clareza de que não é possível ensinar sem contexto, de que não é prudente quebrar os conteúdos em caixinhas cada vez menores para acelerar o repasse de informações.

A escola deve estar articulada com a vida real. Na vida real não tem caixinha. Tudo está conectado numa grande teia de interações presenciais e virtuais. Os problemas não são apresentados as pessoas de forma fragmentada. Portanto, é preciso elaborar uma proposta pedagógica que dialogue melhor com as necessidades de cada cidadão em formação.

Nesse sentido, as relações interpessoais; o senso estético; vivência das artes; questões sobre identidade e construção do EU; gestão de conflitos; resiliência; protagonismo, entre outros, devem ser, além dos conteúdos clássicos, pauta oficial da escola que se propõe a formar integralmente seus estudantes.

sábado, 18 de junho de 2016

Integração curricular: como tornar possível?

Fala-se em integração curricular porque a aprendizagem significativa, que faça sentido, precisa ocorrer de modo a proporcionar o entendimento das complexidades da sociedade contemporânea. As caixinhas das disciplinas, isoladamente, não respondem a essa exigência.

É claro que deve haver espaço na escola para o específico. As disciplinas assim foram estruturadas para dar conta da tradução didática de conhecimentos científicos bastante robustos que foram desenvolvidos ao longo dos tempos. Portanto, não defendo friamente o fim das disciplinas e o ensino por áreas, como muitos o fazem. A escola precisa de conteúdo, não apenas de forma.

Creio ser possível uma organização curricular que consiga dar conta da integração dos saberes sem a eliminação, necessariamente, das disciplinas. Claro que requer desprendimentos e mudança de paradigma na concepção e organização da agenda de cada componente do currículo.

Na rede estadual do Ceará, vem se desenvolvendo uma experiência que já chamei a atenção em outros textos: o Núcleo Trabalho, Pesquisa e demais Práticas Sociais (NTPPS).

O NTPPS proporciona, entre muitas outras experiências, duas atividades que considero basilares para uma proposta de integração curricular: a construção do projeto vida por cada estudante; e a apropriação do método científico.

Com o projeto de vida de cada estudante sistematizado, a escola tem elementos preciosos para reestruturar seu projeto educativo em itinerários diversificados. Isso traz o estudante para o centro das decisões. As ofertas de disciplinas do núcleo comum e eletivas devem dialogar com esses projetos.

A apropriação do método científico pelos estudantes efetiva a construção do conhecimento. Quando o aluno se envolve em um projeto científico, a aprendizagem ganha significado pois o que se estuda nas disciplinas passa a fazer sentido e ajuda a compreender situações reais.

É o início de um longo debate. Mas precisamos empreender novas iniciativas para proporcionar a tão necessária integração curricular.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Escola de ensino médio não pode ser binária

A escola de ensino médio não pode ser estruturada com apenas uma proposta formativa. Se assim o é, o aluno tem duas decisões possíveis: topa o desafio de se adequar ou a abandona. Portanto, binária.

E nesse modelo tem-se um agravante: nem todos que topam o desafio de se adequar, conseguem aprender o esperado para a série que estuda. Por sinal, é um percentual ainda muito rebaixado.

Não há saída já pronta. A tradição educacional brasileira é muito forte e "meritocrática", ou seja, se coloca um caminho formativo com os mais avançados conhecimentos das ciências organizados em 13 disciplinas. Os que conseguirem ter um aprendizado satisfatório em "todas", é declarado bem sucedido na escola e consegue as vagas mais concorridas na universidade.

A grande questão é que no Brasil não se consolidou a visão de que temos juventudes com interesses múltiplos. Ou mais grave, até se compreende isso, mas não os considera legítimos a ponto de organizar a escola de ensino médio que dialogue com esses interesses.

Não consigo vislumbrar outro caminho nesse momento senão o dos tempos eletivos como alternativa para flexibilizar o currículo do ensino médio. É preciso que aos estudantes seja dada a oportunidade de trilhar itinerários formativos que respondam melhor ao que está posto nos seus projetos de vida.

A minha crença é que o estudante, ao desenvolver aprendizagens associadas com seus interesses, consiga se vincular ao projeto pedagógico da escola assumindo o protagonismo estudantil e sentindo, verdadeiramente, que a escola faz sentido.

quinta-feira, 9 de junho de 2016

A organização curricular no Brasil pós 1990

Nos anos de 1990 ocorreu o maior processo de inclusão de crianças na escola. Período pós promulgação da constituição cidadã, onde se registra o maior aumento de matrículas e, consequentemente, dos índices de atendimento da faixa etária de 7 a 14 anos, prioridade naquele momento.

A população brasileira, em toda a sua diversidade, passou a estar presente na escola, instituição que até pouco tempo era privilégio de um número bem inferior de cidadãos.

Mas o modelo pedagógico, a estrutura curricular e os instrumentos de aferição da aprendizagem continuaram os mesmos praticados numa escola menos plural, claramente elitista e baseada no controverso "espírito" da meritocracia, onde se classificava do "melhor" para o "pior" aluno. 

O currículo não se adequou ao novo movimento republicano que se instalava no Brasil, pois continuou unitário, padrão e impositivo. Ora, a escola recebeu o "novo" aluno da escola pública mas o tratou como se as características dos já incluídos tivessem. Infelizmente, os altos índices de retenção e abandono mostram a inadequação do modelo pedagógico. Esse movimento claramente exigia uma nova escola.

Passados quase três décadas dessa restruturação da escola pública, ainda não conseguimos repensar a organização curricular de modo a dialogar efetivamente com esses sujeitos. Contabilizamos quase 17% de jovens de 15 a 17 anos fora da escola e é preciso criar uma escola verdadeiramente inclusiva.

Nesse contexto, pensar a flexibilidade do currículo com a composição de itinerários formativos diversos pode representar uma mensagem mais objetiva de que se quer respeitar as diferenças e possibilitar o sucesso acadêmico de todos os estudantes.

sexta-feira, 3 de junho de 2016

O ensino médio deve proporcionar múltiplos itinerários formativos

A escola que apresenta aos jovens que cursam o ensino médio apenas um itinerário formativo, com os tempos de cada componente curricular pré definido, dificilmente conseguirá dialogar com os seus anseios e diferentes projetos de vida.

Paira na cultura educacional brasileira que a organização curricular presente em quase a totalidade das escolas, públicas e privadas, os tempos e as disciplinas, é uma definição ad infinitum pois se acredita ser a única possível.

A LDB já aponta outros caminhos, como vemos no Art. 23: "A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar."

Mesmo com esse indicativo legal, percebe-se um grande receio em buscar alternativas no sentido de diversificar a forma de oferta do ensino médio. Adota-se o modelo unitário, seriado e hierárquico. A escola define autocraticamente os tempos de cada disciplina, dando mais aula sobre os temas tidos como mais importantes e o interesse dos alunos não é, infelizmente, considerado.

Defendo, portanto, uma organização escolar baseada num projeto pedagógico de itinerários formativos múltiplos, onde boa parte do tempo dos estudantes é de cunho eletivo e que a escola consiga ajudá-los a trilharem uma formação alinhada com seus projetos de vida, com suas expectativas de desenvolvimento profissional e práticas de cidadania.

É claro que isso exige a consolidação de novos paradigmas pedagógicos: a aula não pode ser pensada desconexa do projeto pedagógico da escola; exige maior capacidade da gestão pedagógica em articular e integrar o currículo.

Enfim, é preciso pensar fora dos dogmas predominantes na educação brasileira atualmente.

terça-feira, 31 de maio de 2016

A pesquisa como princípio pedagógico

A educação fundada simplesmente na transmissão de conhecimento é a maior ruptura que precisamos promover no Brasil. Essa ruptura não é apenas um modismo pedagógico. Ela é necessária para se construir uma agenda escolar mais significativa para os estudantes, principalmente no ensino médio.

Antes de prosseguir com essa reflexão, quero deixar claro que não se trata da eliminação da aula expositiva. Ela continua tendo importância como estratégia didática. A exposição de um conteúdo pelo professor permite ao aluno compreender como organizar o conhecimento científico no contexto de um discurso. E isso é um grande aprendizado. Faço essa ressalva pois muitos educadores tendem a radicalizar quando é abordado a necessidade de uma estrutura didática participativa, em que os estudantes são o centro do processo, como é o caso da pedagogia de projetos e da pesquisa.

Não é novidade para nenhum educador, e creio ser um consenso, que um estudante, ao se envolver numa pesquisa científica, aprende a aprender no decorrer do processo de investigação. E esse aprendizado não pode esperar a pós graduação para ser desenvolvido. Tem que ser estimulado na educação básica.

Não há contribuição mais impactante da escola na vida de um cidadão em formação cidadã do que a promoção da autonomia intelectual. E sobre isso não tenho dúvida: oportunizar aos estudantes o domínio do método científico e sua aplicação em pesquisas científicas é um pilar da educação escolar de nosso tempo.

É importante desmistificar a crença que a pesquisa científica é para poucos sob o pretexto de que que muitos alunos não tem a disciplina necessária para estabelecer o rigor que legitime os "achados" da pesquisa. Ora, é preciso superar o saber natural. Protagonismo estudantil e rigor científico se educa.

Portanto, todos os alunos podem aprender a desenvolver pesquisas na educação básica e extrair o que há de melhor no processo de aprendizagem escolar: a autoria.

A educação pensada em sujeitos

Um dos maiores equívocos é estruturar uma escola para os sem rosto, sem história, sem nome.

A escola é a instituição responsável para apresentar aos jovens as informações e conhecimentos sistematizados e acumulados pela humanidade. Isso caracteriza a educação formal. Mas me preocupa a forma como isso acontece no cotidiano do ensino e aprendizagem.

A agenda escolar é elaborada, quase como regra, sem considerar os sujeitos que a frequentam. Infelizmente ainda estamos organizados para ofertar uma educação para massas, no modelo série, como nas fábricas.

Primeiro se dá o conteúdo, depois se pergunta se foi interessante e significativo. E se a resposta for NÃO, e na maioria das vezes não é, logo os estudantes são acusados de não quererem nada com a vida e ganham o taxativo selo de desinteressados pela escola.

Uma outra organização escolar é possível. Mas nós educadores precisamos desenvolver uma habilidade bem específica para melhorar a relação com os estudantes: saber ouvir e ler as suas histórias de vida.

Esta habilidade permite aos educadores, entre outras coisas, enriquecerem suas práticas pedagógicas, consolidando a desmassificação das relações e do ensino.

Portanto, desenvolver a premissa do estudante como sujeito poderá gerar a maior transformação de todos os tempos na educação escolar. E aí veremos o por que é tão importante pensar em diversificar itinerários formativos, estruturar tempos eletivos e contextualizar o que se ensina.

O que fazer com os sonhos dos jovens?

Essa questão é colocada para os adultos, pois os jovens simplesmente sonham, e sonham muito, e que bom que sonham!

Faço essa pergunta ao meu silêncio todos os dias. E geralmente a minha conclusão é que nós não conseguimos dialogar bem com as expectativas desses sujeitos, seja em casa, como pais, ou na escola, como profissional da educação.

Penso às vezes que se manifesta nessa relação uma espécie de vingança dos adultos por não terem conseguido emplacar boa parte dos seus sonhos quando passávamos por esta construção ideária do futuro.

Penso também na expressão que o Brasil é o país do futuro pois tem muitos jovens em formação e o por que desta máxima nunca ter se confirmado efetivamente. Será que isso aconteceu porque ao invés de interpretarmos as novas visões de futuro manifesta nos sonhos dos jovens preferimos fazer os jovens se adequarem ao presente? Se a resposta for sim, explica a repetição de práticas geração após geração.

Após muitas reflexões a respeito, minha conclusão é que nós precisamos construir uma relação com os jovens de modo a ajudá-los a elaborar seus projetos de vida, dando a eles condições para realizarem seus sonhos, ao contrário de convencê-los a esquecer que o futuro pode ser bem melhor que o presente.

É nesse contexto que se fala tanto em protagonismo juvenil, estudantil. Para termos uma educação verdadeiramente significativa, os jovens precisam aprofundar sua percepção sobre si mesmos e projetar seus sonhos de uma vida cheia de mudanças e de realizações bem sucedidas, mas que precisa ser esboçada a partir de ações concretas no presente.

Educar jovens no ensino médio

Educar jovens no ensino médio está entre os grandes desafios na atualidade. Este ponto está na pauta de sistemas de ensino do mundo inteiro, mas é ainda mais desafiador em países com desigualdades de oportunidades educacionais elevadas, como o Brasil.

Pelo tamanho do desafio, devemos pensar em estratégias de abrangência macro, ou seja, de políticas educacionais, e de fortalecimento do clima escolar, alicerçado nos preâmbulos de uma escola para as juventudes.

Considerando esse cenário, creio que é preciso pensar no seguinte:

- No âmbito das definições e atividades das secretarias de educação: a) garantir as condições de funcionamento da escola, priorizando a autonomia financeira e pedagógica de cada unidade; b) liderar discussões com sua rede para sistematização de inovações relacionadas a modelos de gestão, a organização curricular e a tecnologias educativas; c) estabelecer princípios inegociáveis a serem atentados em todos os segmentos da rede. Sobre esses princípios, faço referência principalmente aos relacionados a inclusão educacional, a altas expectativas de elevação de resultados acadêmicos e a crença de que todos são capazes de aprender, independente da situação econômica e social.

- No âmbito da estrutura escolar: a) consolidar a pedagogia do diálogo e a sistemática de construção coletiva de entendimentos naquilo que precisa ser realizado para que a escola cumpra seu papel social e garanta a aprendizagem dos seus estudantes; b) focar nos aspectos da aprendizagem em sala de aula, no suporte ao processo de ensino e no cuidado para que os alunos verdadeiramente sintam-se contemplados no processo; c) criar e fortalecer o sentimento de que todos os estudantes, todos, são capazes de desenvolverem seus projetos de vida tendo a educação como pilar.

A lista do que é preciso estruturar deve ser pequena mesmo. Os desdobramentos de cada item mencionado acima são complexos, e a dispersão de energia das secretarias e das escolas não ajuda, absolutamente, em nada.

Apoio ao trabalho do professor

O trabalho do professor não pode ser solitário. Deve ser, acima de tudo, cooperativo e solidário. A escola,  portanto, precisa se organizar para dar o apoio necessário no sentido de proporcionar a construção de saberes e práticas coletivas.

A tarefa de educar crianças e jovens é complexa, principalmente no contexto da educação pública, onde a diversidade de interesses está mais presente. O trabalho individual, nesse contexto, gera intranquilidade para o professor.

Logo, é importante que se enfatize, educar é muito mais que preparar a exposição de um conteúdo. A gestão da sala de aula requer outros planejamentos que extrapolam o domínio do conteúdo e exigem a organização de uma didática que esteja sintonizada com as características dos estudantes.

O diálogo entre pares, permanente e sistemático, na elaboração de planos de aula e formação contínua, deve ser garantido para que o professor se sinta seguro no desenvolvimento de sua prática docente.

Diretor(a) escolar, e sua equipe de coordenadores, precisa concentrar esforços para garantir esse apoio aos professores. As demais tarefas, são de segunda ordem.