segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

Educação é a prática da ciência

Rogers Mendes

A escola deve ensinar muitos conteúdos considerados importantes para a sociedade. A proposta pedagógica deve estar alinhada às expectativas pessoais de cada estudante, mas deve também corresponder a demandas sociais relacionadas à convivência na diversidade e ao ingresso no mundo do trabalho. 

Mas tem um saber que deve ser estruturante e inequívoco no processo educativo: construir conhecimentos pela prática da ciência e dos seus métodos de pesquisa. 

Tem-se falado que estamos vivendo na sociedade do conhecimento. Contudo, o que isso quer dizer na prática? 

Em síntese, o conhecimento, na perspectiva contemporânea, não é algo que se aprende somente pelo ensino ministrado pelos mais 
experientes, mas se desenvolve constantemente pelo exercício da investigação, sistematização de métodos e expressão das conclusões e dos achados consequentes.

Portanto, a escola que se propõe a 
educar nos valores desta sociedade, prepara crianças e jovens para fazerem descobertas e ensaiarem soluções para os problemas identificados, em vez de proporcionar a simples memorização e acumulação de informações.

A sociedade do conhecimento é caracterizada pela participação efetiva de cada cidadão na produção de saberes e reflexões ativas. Educação, considerando esta dimensão, promove o aprender a aprender com vistas a termos capacidade de continuar a descobrir, conceber e desenvolver-se de forma contínua por toda a vida.

Ao pensar nestas premissas, a Secretaria da Educação promove o Ceará Científico, ocasião em que alunos da rede pública apresentam pesquisas científicas, destacando 
a construção e delimitação do problema e a descrição do processo de investigação e suas conclusões e descobertas. Neste ano, aconteceu no Shopping RioMar Fortaleza entre os dias 4 e 6 de dezembro e envolveu 414 alunos apresentando 184 trabalhos.

O que se quer com esta ação é estimular a pesquisa e a ciência como princípio pedagógico a fim de que tenhamos cidadãos ques-
tionadores e capazes de sistematizar sua compreensão a respeito do que lhe desafia.

Como disse Paulo Freire: “o educador democrático não pode negar-se o dever de, na sua prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, sua insubmissão”.


Artigo publicado no Jornal O Povo em 30 de dezembro de 2019.

quarta-feira, 20 de novembro de 2019

20 de novembro


*Por Alexsandro Santos


Num país no qual um parlamentar que integra o Congresso Nacional se sente autorizado a afirmar que "os negros" (como grupo racial) cometem mais crimes - e, por isso, são mais mortos pela polícia - do que os demais grupos raciais, simplesmente não há espaço para a dúvida da relevância da data de hoje.

A ideia - pretensamente universalista, pretensamente "desracializada" - de que datas como essa são inadequadas porque "somos todos iguais, somos todos humanos", para mim, só pode ser aceita por três categorias de sujeitos:

1. Aqueles que não compreenderam ainda que o racismo é um sistema ideológico e - portanto - deixam de enxergar seus efeitos na sua própria visão de mundo. Embora bem intencionados, seguem guiados por um conjunto de crenças e valores cuidadosamente disseminados e cultivados na sociedade racista brasileira. São brancos, são negros, são de todas as raças. Mas foram catequizados numa cartilha em que se aprende que basta não falar de racismo para ele desaparecer. Ouso chamá-los de desavisados por desconhecimento.

2. Aqueles que - no gozo dos privilégios do sistema social hierarquizado e racista - não suportam a ideia de que sua posição superior na sociedade contemporânea se explica, em grande parte, por um processo histórico mediante o qual todos os seres humanos foram obrigatoriamente racializados (mas cada um numa posição) e que uma parcela ganhou e/ou herdou benesses produzidas pelos mais de 300 anos de coisificação do corpo negro e de transformação de homens e mulheres africanos na mercadoria mais rentável do capitalismo. Vivem no chamado pacto narcísico da branquitude (ainda que, na maior parte das vezes, sua branquitude seja tão fajuta quanto a estátua da liberdade da Havan) .Ouso chamá-los de desavisados por hipocrisia (ou cinismo).

3. Aqueles que foram embriagados pelo autoritarismo e pelo protofacismo que, silenciosa e lentamente, se manteve atuante após a redemocratização brasileira e que, nos últimos anos, saiu às ruas sem nenhum tipo de borda ou limite. Vomitam, sem qualquer pudor, o racismo em palavras e em atitudes - as vezes mais implicitamente, outras mais explicitamente. Ouso chamá-los de genocidas por conivência.

Estou disposto a dialogar com os primeiros. Com algum esforço, com os segundos. Quanto aos últimos, repito o que disse Elza Soares: Meu amor, suma.



* Mestre em Educação: História, Política, Sociedade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo. Atualmente é Coordenador do Programa de Pós-Graduação da Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo e do curso de Pedagogia da Faculdade do Educador - FEDUC

quarta-feira, 6 de novembro de 2019

A educação está a serviço de um projeto de sociedade


O processo educativo, em qualquer contexto, nunca foi e não será isento. Sempre estaremos discutindo o projeto de sociedade que está na base da formação humana e dos princípios que devem permear a prática do ensino-aprendizagem.
O discurso autoritário baseado em uma suposta neutralidade da educação é uma ensurdecedora falácia.
O Brasil é um país diverso, cujas relações sociais foram forjadas em uma estrutura aristocrática e escravista. A origem do Estado Brasileiro está fincada, portanto, no autoritarismo e na ideia de cultura dominante e que se esforça em negar as manifestações do que não é espelho. Se o projeto de sociedade que se defende tem relação com este modelo, a escola não precisa contextualizar o que ensina e, nesta premissa, a “escola não é para todo mundo”. 
Ensinar os “conteúdos já legitimados” e promover a memorização de conceitos-chaves das ciências, somente, responderia à expectativa deste modelo societário, pois não se questiona o que se deve aprender.
Por outro lado, se o projeto de sociedade se pauta na inclusão, que cultiva a crença de transformação das realidades socioeconomicamente vulneráveis por meio da educação e na ampliação irrestrita das oportunidades de desenvolvimento de cada pessoa, a escola deve ampliar seu referencial curricular e ir além dos processos de aprendizagem sobre o nosso código linguístico e das ciências.
A escola pensada para todos não pode ser isenta. O conceito de multicultura deve estar presente nas práticas educativas. A história de vida dos estudantes precisa ser externada e reconhecida para que se criem vínculos entre a identidade pessoal e comunitária com a visão de futuro a respeito da própria existência. 
Nesta perspectiva, proporcionar ao estudante a percepção da realidade em que vive na dinâmica do que se estuda promove algo que a escola “clássica” tem dificuldade em ensinar: a conjugação do verbo esperançar, que se traduz na capacidade de se juntar a outros para construir de outro modo.
A ação educativa está associada a um projeto de sociedade. Não se pode pensar escola sem refletir sobre os próximos passos de amadurecimento da nossa nação: como queremos nos ver no futuro?

Artigo publicado no Jornal O Povo em 6 de novembro de 2019

terça-feira, 4 de junho de 2019

Por uma visão sistêmica da educação infantil à pós-graduação

*Foto do site https://educacaointegral.org.br/conceito/

É absolutamente incoerente considerar a educação básica e a superior como antagônicas. O binômio educação e desenvolvimento econômico-social se estabelece a partir de uma visão sistêmica e pela efetivação de um projeto de nação alicerçado no desenvolvimento pleno das pessoas.

Se pensarmos o sistema educacional de forma separada, olhando para a educação básica em detrimento do ensino superior, surgem questões óbvias: quem cuidará da formação dos educadores? Onde se fará pesquisas para subsidiar estratégias que objetivem a qualificação de projetos pedagógicos?

À medida que o Brasil conseguiu ser eficiente no atendimento escolar, alcançando a quase universalização da matrícula das crianças com 6 anos de idade, surgiu a necessidade de termos professores bem formados em nível superior, capazes de dar as oportunidades educacionais necessárias para a conclusão do ensino médio e inserção dos jovens em cursos universitários para consolidar a espiral do desenvolvimento humano.

Como então desenvolver a educação básica sem ter universidades de excelência?

Não sei responder senão reafirmando a relação imbricada desses níveis de ensino.

É claro que podemos levantar muitos aspectos a serem melhorados na relação educação básica e o ensino superior. Mas é inegável a contribuição das instituições de ensino superior em dois aspectos: na formação dos futuros professores da educação básica e na oferta das variadas possibilidades para se dar continuidade aos estudos, permitindo aos estudantes o aperfeiçoamento profissional para atuar nas diversas áreas laborais.

Para muito além disso, a educação é capaz de promover a transformação da face econômica e social de uma nação quando o cuidado com o desenvolvimento integral do ser humano está também associado à inovação tecnológica, à pesquisas científicas de alto impacto para a vida das pessoas, para o crescimento econômico, e que consigam explicar questões caras à existência humana e as relações complexas que se estabelecem na sociedade.

Assim, o Brasil, capitaneado pelo Ministério da Educação, deve conduzir um debate nacional para o fortalecimento deste sistema. É disso que verdadeiramente precisamos.

domingo, 5 de maio de 2019

Onde está a política de Estado?


Eloisa Vidal* 


A política educacional de uma nação é questão de Estado e não de governo. Pelo menos é assim em países desenvolvidos, que entra governo e sai governo pertencentes a partidos de matizes ideológicas distintas, e a educação das novas gerações continua seguindo diretrizes elaboradas em décadas anteriores. Esses pactos sociais e políticos têm permitido que os países avancem na melhoria da qualidade educacional, como a Finlândia, que fez isso nos anos de 1970 e os resultados começaram a aparecer no Pisa em 2000, e mais recentemente, Portugal, cujas iniciativas de reformas educacionais começam nos anos 1990 e que vem mostrando uma evolução expressiva em avaliações internacionais.

O Brasil chega ao século XXI com problemas educacionais que outros países resolveram no século XIX, como a alfabetização de adultos, o acesso universal e uma política de financiamento claramente definida para a educação pública. Só a partir da Constituição de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996, é que o País começa a organizar seu sistema educacional. Estamos falando de algo novo, com cerca de 30 anos, portanto, sujeito a muitos ajustes e desafios de implementação. Ainda não conseguimos universalizar o ensino médio, por exemplo, e o acesso ao ensino superior está abaixo dos percentuais dos países desenvolvidos e de vários países da América Latina.

Mas não podemos negar que avançamos muito nesses trinta anos. Universalizamos o acesso de 4 a 14 anos, o que significa educação pré-escolar e ensino fundamental; melhoramos as taxas de aprovação; corrigimos parte da distorção idade-série. Essas ações coordenadas, sistêmicas e contínuas só foram possíveis graças as condições de financiamento que perpassaram os governos no período 1996 - 2016. Isso tudo está ameaçado diante do impasse sobre o financiamento da educação brasileira, seja pelo destino incerto do Fundeb, seja pelas possibilidades levantadas sobre a desvinculação dos percentuais assegurados na Constituição de 1998 - 18% da União e 25% dos estados e municípios.

Falar em desenvolvimento e não priorizar a política educacional é um caminho que se dirige para o abismo. Educação para poucos, além de excluir a maioria, funciona como uma bomba relógio de conflitos sociais que mais dia, menos dia, explode e pode representar retrocessos assustadores.


*Eloisa Vidal é professora da Universidade Estadual do Ceará - Uece
Artigo publicado no Jornal O Povo, 04/05/2019

quinta-feira, 2 de maio de 2019

Novo MEC, velho MEC


por Idilvan Alencar*

A cada dia a nova gestão do Ministério da Educação se aproxima da gestão Vélez Rodríguez e de sua inútil pauta de "guerra ideológica". Depois do ataque aos cursos de Sociologia e Filosofia e do apoio à aluna que filmou uma professora em sala de aula com objetivos políticos, agora é a vez de atacar o patrono da educação brasileira, Paulo Freire, e cortar recursos de universidades federais que promovam "balbúrdia e eventos ridículos" em suas instalações, sem qualquer critério objetivo para justificar tais cortes.

O ataque a Paulo Freire partiu do próprio presidente Bolsonaro, ao revelar em entrevista intenção de mudar o patrono da educação brasileira sem qualquer justificativa. Freire é um dos educadores mais respeitados no mundo, com pelo menos 35 títulos Honoris Causa de universidades da Europa e da América. Seu livro "A Pedagogia do Oprimido" é o terceiro mais citado em trabalhos acadêmicos na área de Humanas no mundo.

A outra nota lamentável do "novo MEC, velho MEC" veio do ministro Weintraub, ao anunciar que três universidades federais - da Bahia, de Brasília e Federal Fluminense - tiveram seus recursos cortados por "balbúrdia ou evento ridículo", sem qualquer critério objetivo, em evidente desrespeito à autonomia universitária e numa clara medida de retaliação contra essas universidades. Medidas virão contra outras instituições que não digam amém à cartilha do MEC e do projeto Escola Sem Partido. Isso é autoritarismo puro. As universidades já enfrentam dificuldades com cortes orçamentários e agora ainda precisam seguir cartilha ideológica para acessar os recursos.

Mais uma vez, o meu apelo é para que o Ministério da Educação se preocupe com os temas reais da educação brasileira e não com essa fantasia de "guerra ideológica". Precisamos de mais creches, mais qualidade na educação básica, mais atratividade para o ensino médio, mais acesso no ensino superior, mais recursos para pesquisa e inovação e mais gestão e recursos para todas as etapas e modalidades, além de melhores salários e condições de trabalho para os professores.

Não vamos tirar o Brasil do seu atraso educacional com ataques a professores, educadores, diretores de escola e universidades. Educação se faz com ideias e projetos e não com discurso vazio.



*Artigo escrito pelo Deputado Federal Idilvan Alencar (PDT/CE) e publicado no Jornal O Povo, 02/05/2019
https://opovo.com.br/jornal/opiniao/2019/04/30/novo-mec--velho-mec.html

quarta-feira, 1 de maio de 2019

Resultados da primeira aplicação do PISA em Sobral


O município de Sobral divulgou ontem os resultados da primeira aplicação do Programa Internacional de Avaliação de Alunos para Escolas (Pisa For Schools, na sigla em inglês).

É uma nova referência para acompanhar a qualidade do ensino em Sobral.

Ver matéria completa no Jornal O Povo




#educação

domingo, 28 de abril de 2019

28 de abril é o Dia Internacional da Educação

O dia 28 de abril, no qual se comemora o Dia Internacional da Educação, é uma referência ao encontro da Cúpula Mundial de Educação, que reuniu representantes de cerca de 180 países em Dakar, Senegal, de 26 a 28 de abril de 2000.

Leia a seguir a íntegra do documento pactuado neste encontro e que tem a assinatura de 164 nações.

Declaração de Dakar. Educação para Todos - 2000

Em Dakar, Senegal, de 26 a 28 de abril de 2000

1. Reunidos em Dakar em abril de 2000, nós, participantes da Cúpula Mundial de Educação, comprometemo-nos a alcançar os objetivos e as metas de Educação Para Todos (EPT) para cada cidadão e cada sociedade.

2. O Marco de Ação de Dakar é um compromisso coletivo para a ação. Os governos têm a obrigação de assegurar que os objetivos e as metas de EPT sejam alcançados e mantidos. Essa responsabilidade será atingida de forma mais eficaz por meio de amplas parcerias no âmbito de cada país, apoiada pela cooperação com agências e instituições regionais e internacionais.

3. Nós reafirmamos a visão da Declaração Mundial de Educação Para Todos (Jomtien, 1990), apoiada pela Declaração Universal de Direitos Humanos e pela Convenção sobre os Direitos da Criança, de que toda criança, jovem e adulto têm o direito humano de beneficiar-se de uma educação que satisfaça suas necessidades básicas de aprendizagem, no melhor e mais pleno sentido do termo, e que inclua aprender a aprender, a fazer, a conviver e a ser. É uma educação que se destina a captar os talentos e o potencial de cada pessoa e desenvolver a personalidade dos educandos para que possam melhorar suas vidas e transformar suas sociedades.

4. Acolhemos os compromissos pela educação básica feitos pela comunidade internacional ao longo dos anos 90, especialmente na Cúpula Mundial pelas Crianças (1990), na Conferência do Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992), na Conferência Mundial de Direitos Humanos (1993), na Conferência Mundial sobre Necessidades Especiais da Educação: Acesso e Qualidade (1994), na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Social (1995), na Quarta Conferência Mundial da Mulher (1995), no Encontro Intermediário do Fórum Consultivo Internacional de Educação para Todos (1996), na Conferência Internacional de Educação de Adultos (1997) e na Conferência Internacional sobre o Trabalho Infantil (1997). O desafio, agora, é cumprir os compromissos firmados.

5. A Avaliação de EPT 2000 demonstra que houve progresso significativo em muitos países. Mas é inaceitável que no ano 2000, mais de 113 milhões de crianças continuem sem acesso ao ensino primário, que 880 milhões de adultos sejam analfabetos, que a discriminação de gênero continue a permear os sistemas educacionais e que a qualidade da aprendizagem e da aquisição de valores e habilidades humanas estejam longe das aspirações e necessidades de indivíduos e sociedades. Jovens e adultos não têm acesso às habilidades e conhecimentos necessários para um emprego proveitoso e para participarem plenamente em suas sociedades. Sem um progresso acelerado na direção de uma educação para todos, as metas nacionais e internacionais acordadas para a redução da pobreza não serão alcançadas e serão ampliadas as desigualdades entre nações e dentro das sociedades.

6. A educação enquanto um direito humano fundamental é a chave para um desenvolvimento sustentável, assim como para assegurar a paz e a estabilidade dentro e entre países e, portanto, um meio indispensável para alcançar a participação efetiva nas sociedades e economias do século XXI. Não se pode mais postergar esforços para atingir as metas de EPT. As necessidades básicas da aprendizagem podem e devem ser alcançadas com urgência.

7. Nós nos comprometemos a atingir os seguintes objetivos:
·       a) expandir e melhorar o cuidado e a educação da criança pequena, especialmente para as crianças mais vulneráveis e em maior desvantagem;
·        b) assegurar que todas as crianças, com ênfase especial nas meninas e crianças em circunstâncias difíceis, tenham acesso à educação primária, obrigatória, gratuita e de boa qualidade até o ano 2015;
·        c) assegurar que as necessidades de aprendizagem de todos os jovens e adultos sejam atendidas pelo acesso eqüitativo à aprendizagem apropriada, a habilidades para a vida e a programas de formação para a cidadania;
·        d) alcançar uma melhoria de 50% nos níveis de alfabetização de adultos até 2015, especialmente para as mulheres, e acesso eqüitativo à educação básica e continuada para todos os adultos;
·        e) eliminar disparidades de gênero na educação primária e secundária até 2005 e alcançar a igualdade de gênero na educação até 2015, com enfoque na garantia ao acesso e o desempenho pleno e eqüitativo de meninas na educação básica de boa qualidade;
·        f) melhorar todos os aspectos da qualidade da educação e assegurar excelência para todos, de forma a garantir a todos resultados reconhecidos e mensuráveis, especialmente na alfabetização, matemática e habilidades essenciais à vida.

8. Para atingir esses objetivos, nós, os governos, organizações, agências, grupos e associações representadas na Cúpula Mundial de Educação, comprometemo-nos a:
·        a) mobilizar uma forte vontade política nacional e internacional em prol da Educação para Todos, desenvolver planos de ação nacionais e incrementar de forma significativa os investimentos em educação básica;
·        b) promover políticas de Educação para Todos dentro de marco setorial integrado e sustentável, claramente articulado com a eliminação da pobreza e com estratégias de desenvolvimento;
·        c) assegurar o engajamento e a participação da sociedade civil na formulação, implementação e monitoramento de estratégias para o desenvolvimento da educação;
·        d) desenvolver sistemas de administração e de gestão educacional que sejam participativos e capazes de dar respostas e de prestar contas;
·        e) satisfazer as necessidades de sistemas educacionais afetados por situações de conflito e instabilidade e conduzir os programas educacionais de forma a promover compreensão mútua, paz e tolerância, e que ajudem a prevenir a violência e os conflitos;
·        f) implementar estratégias integradas para promover a eqüidade de gênero na educação, que reconheçam a necessidade de mudar atitudes, valores e práticas;
·        g) implementar urgentemente programas e ações educacionais para combater a pandemia HIV/AIDS;
·         criar ambientes seguros, saudáveis, inclusivos e eqüitativamente supridos, que conduzam à excelência na aprendizagem e níveis de desempenho claramente definidos para todos;
·        h) melhorar o status, a auto-estima e o profissionalismo dos professores;
·        i) angariar novas tecnologias de informação e comunicação para apoiar o esforço em alcançar as metas EPT;
·        j) monitorar sistematicamente o progresso no alcance dos objetivos e estratégias de EPT nos âmbitos internacional, regional e nacional;
·        k) fortalecer os mecanismos existentes para acelerar o progresso para alcançar Educação para Todos.

9. Baseando-se na evidência acumulada durante as avaliações de EPT nacionais e regionais e em estratégias setoriais já existentes, todos os Estados deverão desenvolver ou fortalecer planos nacionais de ação até, no máximo, 2002. Estes planos devem ser integrados em um marco mais amplo de redução da pobreza e de desenvolvimento, e devem ser elaborados por meio de processos mais democráticos e transparentes que envolvam todos os interessados e parceiros. Os planos irão abordar problemas relacionados com o sub-financiamento crônico da educação básica, estabelecendo prioridades orçamentárias que reflitam um compromisso em alcançar os objetivos e as metas de EPT o mais cedo possível ou no máximo até 2015. Também definirão estratégias claras para superar problemas especiais daqueles que estão atualmente excluídos das oportunidades educacionais, com um compromisso claro com a educação de meninas e a eqüidade de gênero. Os planos darão forma e conteúdo para os objetivos e estratégias estabelecidos neste documento e para os compromissos estabelecidos durante a sucessão de conferências internacionais dos anos 90. Atividades regionais para apoiarem estratégias nacionais deverão estar baseadas no fortalecimento das organizações, redes e iniciativas regionais e sub-regionais. 

10. Vontade política e uma liderança nacional mais forte são necessárias à implementação efetiva e bem sucedida dos planos nacionais em cada um dos países. No entanto, a vontade política precisa sustentar-se em recursos. A comunidade internacional reconhece que, atualmente, muitos países não possuem recursos para alcançar uma Educação para Todos dentro de um prazo aceitável. Recursos financeiros novos, de preferência na forma de doações, devem, portanto, ser mobilizados pelas agências financeiras bilaterais e multilaterais, incluindo o Banco Mundial e bancos regionais de desenvolvimento, assim como o setor privado. Afirmamos que nenhum país seriamente comprometido com a Educação para Todos será impedido de realizar este objetivo por falta de recursos.

11. A comunidade internacional dará andamento a este compromisso coletivo, desenvolvendo imediatamente uma iniciativa global com vistas a desenvolver estratégias e mobilizar os recursos necessários para providenciar apoio efetivo aos esforços nacionais. As opções que serão consideradas nesta iniciativa seguem abaixo:
·       a) aumentar o financiamento externo para a educação básica;
·         b) assegurar prognóstico confiável no fluxo do auxílio externo;
·         c) facilitar uma coordenação mais efetiva de doadores;
·         d) providenciar alívio e/ou cancelamento da dívida em tempo mais curto e de forma mais ampla para reduzir a pobreza, e com forte compromisso na educação básica;
·         e) realizar um monitoramento mais efetivo e regular do progresso em atingir metas e objetivos de EPT, incluindo avaliações periódicas.

Já há evidência em muitos países do que pode ser feito por meio de estratégias nacionais fortes, apoiadas em uma cooperação efetiva de desenvolvimento. O progresso dessas estratégias pode - e deve - ser acelerado por meio de um maior apoio internacional. Ao mesmo tempo, aos países com estratégias menos desenvolvidas - incluindo aqueles países afetados por conflitos, os que estão em transição e os países recém saídos de crise - deve ser dado o apoio necessário para atingirem um progresso mais rápido na Educação para Todos.

12. Fortaleceremos os mecanismos internacionais e regionais para que expressem claramente esses compromissos e asseguraremos que o Marco de Ação de Dakar esteja na agenda de todas as organizações internacionais e regionais, todos os corpos legislativos nacionais e todos os fóruns locais responsáveis por decisões.

13. A Avaliação de EPT de 2000 realça que o desafio maior da Educação para Todos está na África sub-saariana e no Sul da Ásia. Neste sentido, embora nenhum país que tenha necessidade deva ser excluído do auxílio internacional, a prioridade deve ser dada a estas duas regiões do mundo. Os países em conflito ou em fase de reconstrução também devem receber atenção especial na construção de seus sistemas educacionais para atenderem às necessidades de todos os educandos.

Fortalecer os mecanismos existentes para acelerar o progresso da Educação para Todos.

14. A implementação dos objetivos e estratégias previamente descritas vai requerer a dinamização imediata de mecanismos nacionais, regionais e internacionais. Para que sejam mais efetivos, estes mecanismos serão participativos e, onde for possível, irão fortalecer o que já existe. Incluirão representantes de todos os participantes e parceiros e irão operar de forma transparente e responsável. Responderão de forma compreensiva à palavra, ao espírito da Declaração de Jomtien e a este Marco de Ação de Dakar. As funções desses mecanismos incluirão, em níveis variados, defesa de direitos, mobilização de recursos, monitoramento e geração e disseminação de conhecimentos sobre Educação para Todos. 

O cerne da atividade de Educação para Todos está no âmbito dos países. Fóruns nacionais de Educação para Todos serão fortalecidos ou estabelecidos para apoiar os resultados a serem alcançados. Todos os ministérios relevantes e as organizações nacionais da sociedade civil serão sistematicamente representadas nestes Fóruns. Estes devem ser transparentes e democráticos e devem constituir um marco de implementação em âmbito sub-nacional. Os países devem preparar Planos Nacionais de Educação para Todos até, no máximo, 2002. Para aqueles países com desafios significativos, tais como crises complexas ou desastres naturais, apoio técnico especial será providenciado pela comunidade internacional. Cada Plano Nacional de Educação para Todos:
·       a) será desenvolvido sob a liderança governamental, consultando diretamente e sistematicamente a sociedade civil nacional;
·         b) atrairá apoio coordenado de todos os parceiros de desenvolvimento;
·         c) especificará reformas referentes aos seis objetivos de Educação para Todos;
·         d) estabelecerá um marco financeiro sustentável;
·         e) será orientado para a ação e especificará prazos;
·         f) incluirá indicadores de desempenho de médio prazo; e
·         g) atingirá uma sinergia de todos os esforços de desenvolvimento humano, pela sua inclusão no planejamento e no processo de implementação do marco de desenvolvimento nacional.

Onde estes processos e um plano confiável estiverem em andamento, membros parceiros da comunidade internacional se comprometem a trabalhar de forma consistente, coordenada e coerente. Cada parceiro contribuirá por meio de auxílio aos Planos EPT Nacionais, de acordo com sua relativa competência para assegurar que as lacunas de recursos sejam adequadamente preenchidas.

As atividades regionais de suporte aos esforços nacionais terão suas bases nas organizações regionais e sub-regionais, redes e iniciativas já existentes, as quais serão fortalecidas quando for necessário. As regiões e sub-regiões decidirão sua rede de Educação para Todos que exerça liderança e que se transformará no Fórum da região ou sub-região com um mandato de Educação para Todos explícito. É essencial o envolvimento sistemático e a coordenação com toda a sociedade civil relevante e com outras organizações regionais e sub-regionais. Estes Fóruns de Educação para Todos Regionais e Sub-regionais articular-se-ão organicamente com os Fóruns Nacionais e a eles prestarão contas. Suas funções serão: coordenação com todas as redes relevantes; estabelecimento e monitoramento das metas regionais / sub-regionais; advocacy; diálogo sobre políticas; promoção de parcerias e de cooperação técnica; compartilhamento de casos exemplares e de lições aprendidas; o monitoramento e o relato para uma prestação de contas responsável; e a promoção da mobilização de recursos. Apoio regional e internacional será disponibilizado para fortalecer os Fóruns Regionais e Sub-regionais e as competências relevantes para se alcançar a Educação para Todos, especialmente na África e no sul da Ásia.

A UNESCO continuará exercendo seu mandato na coordenação dos parceiros de Educação para Todos e a manter seu ímpeto de colaboração. Neste sentido, o Diretor Geral da UNESCO convocará anualmente um pequeno grupo flexível de alto nível. Este servirá de alavanca para o compromisso político e a mobilização de recursos técnicos e financeiros. Recebendo informações de monitoramento dos institutos da UNESCO (IIEP, IBE, UIE), e, especialmente, do Instituto de Estatísticas e dos Fóruns Regionais e Sub-regionais, também terá oportunidade de cobrar responsabilidade da comunidade global pelos compromissos assumidos em Dakar. Será composto de líderes do mais alto nível de governos e da sociedade civil de países desenvolvidos e em desenvolvimento, assim como das agências de desenvolvimento.

A UNESCO servirá de Secretaria. O foco de seu programa educacional será adaptado a fim de colocar os resultados e as prioridades de Dakar no centro de seu trabalho. Isto envolverá o estabelecimento de grupos de trabalho para cada um dos seis objetivos estabelecidos em Dakar. Esta Secretaria trabalhará próxima a outras organizações e poderá incluir pessoas por elas cedidas.

Alcançar a Educação Para Todos demandará apoio financeiro adicional dos países, aumento da ajuda para o desenvolvimento e perdão da dívida em prol da educação por parte dos doadores bilaterais e multilaterais, o que custará em torno de U$ 8 bilhões por ano. Portanto, é essencial que novos compromissos financeiros concretos sejam firmados pelos governos nacionais e também pelos doadores bilaterais multilaterais, incluindo-se o Banco Mundial, os bancos regionais de desenvolvimento, a sociedade civil e as fundações.

28 de abril de 2000.
Dakar, Senegal

sexta-feira, 5 de abril de 2019

O protagonismo estudantil e o processo de aprendizagem

A metacognição é um conceito pouco explorado nos projetos político-pedagógicos das escolas brasileiras. Ela está relacionada a um dos quatro pilares da educação defendidos no relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, coordenado por Jacques Delors, e é conhecida como Aprender a Aprender.

Talvez por seguir uma tradição tácita começada nos primeiros anos da oferta da educação formal em nosso país, observa-se demasiado enfoque no conhecimento tutelado.

Oportunizar autonomia intelectual e emancipatória não parece ser uma premissa educativa que salta aos olhos ao observar o cotidiano escolar por ora, mas já é possível relatar muitas iniciativas em curso que são muito promissoras.

Apesar dos alertas de Paulo Freire, não nos distanciamos tanto quanto  gostaríamos do que caracteriza a educação bancária. Nossa pedagogia, nesse sentido, continua com traços marcantes de autoritarismo e intransigência diante da necessidade de tratarmos o processo de desenvolvimento do conhecimento como algo fluido, construído numa teia complexa dos novos padrões das relações sociais globais e por meio do acesso quase irrestrito às informações, bem como a maior capacidade de publicização das reflexões elaboradas por cada pessoa. As verdades, na contemporaneidade, são constantemente contestadas no livre acesso aos variados meios de compartilhamento de ideias e achados científicos.

Para uma educação verdadeiramente transformadora, mais do que a tentativa de se “transmitir” conhecimento por meio da exposição incessante de conteúdos e informações minimamente sistematizadas pelo método científico, é muito importante possibilitar ao estudante a consciência sobre seu processo individual de desenvolvimento da aprendizagem, sobre estratégias para aprender de forma autônoma e proativa o que lhe é apresentado no currículo regular ou o que é fruto da revelação de sua curiosidade e necessidade.

O estudante, nesta percepção pedagógica, deve ser protagonista no processo de aprendizagem mediado pelos estímulos e planos de trabalho dos professores.

A educação pensada para uma “massa” de pessoas, sem considerar o protagonismo dos estudantes, reúne todas as características para nada fazer frente à necessidade de se reduzir as desigualdades no que tange ao desempenho educacional.

Cuidar para que os estudantes participem ativamente da sua aprendizagem pressupõe a realização de um trabalho intencional a partir do conceito de metacognição. Alunos precisam compreender os objetivos educacionais relacionados ao desenvolvimento do currículo, bem como os procedimentos avaliativos, serem orientados a elaborarem seus projetos de vida e fazer parte conscientemente do pacto pedagógico com professores e gestão em prol do sucesso acadêmico.

Protagonismo estudantil, portanto, é uma condição para a aprendizagem. No entanto, esse protagonismo não se desenvolve “naturalmente” ou por meio de estímulos frágeis. Precisa estar no bojo das ações pedagógicas, da intencionalidade formativa. Desenvolver a metacognição e criar as condições para o desenvolvimento da aprendizagem autônoma, consciente e solidária são basilares para a boa educação.

quinta-feira, 7 de março de 2019

A boa escola tem como referência a equidade

Izolda Cela
Rogers Mendes

A escola, em especial a pública, tem uma função primordial em uma República guiada pelos princípios da participação democrática e da justiça social: gerar oportunidades de desenvolvimento cognitivo e socioemocional a todas as crianças e jovens.

Mas este "todas" não pode simplesmente fazer parte da retórica audível para os mais progressistas. Precisa ser uma obsessão dos educadores, da sociedade brasileira. Isso exige a implementação de estratégias políticas e pedagógicas integradas e assertivas.A escola, em especial a pública, tem uma função primordial em uma República guiada pelos princípios da participação democrática e da justiça social: gerar oportunidades de desenvolvimento cognitivo e socioemocional a todas as crianças e jovens.

Mas este "todas" não pode simplesmente fazer parte da retórica audível para os mais progressistas. Precisa ser uma obsessão dos educadores, da sociedade brasileira. Isso exige a implementação de estratégias políticas e pedagógicas integradas e assertivas.

Essa é a premissa de todas as nações que conseguiram estabelecer um ciclo de progresso social. Admitir e naturalizar a desigualdade educacional tendo como justificativa o desinteresse da pessoa ou questões associadas às condições socioeconômicas pode significar o afastamento de gerações das benesses de uma convivência pacífica e permeada pelo trabalho.

Por vezes, somos tentados a medir qualidade educacional a partir do mérito individual dos que alcançam altos padrões de desempenho acadêmico e boas colocações nas disputas por vagas nos cursos universitários. Claro que esta conquista também integra o conjunto de indicadores que condizem ao sucesso alcançado por uma escola ou rede de ensino. Mas isoladamente, não é suficiente.

A atenção aqui vai para o plano de desenvolvimento integral de todas as pessoas para poderem conquistar e construir seus parâmetros de dignidade nas relações sociais e laborais. É preciso afirmar: não há justiça social em território que não consiga produzir equidade e oferecer oportunidades de desenvolvimento de cada pessoa.

O Ceará tem demonstrado um bom caminho neste quesito. Crianças que cursam o 5º ano do ensino fundamental nas escolas públicas, independentemente da condição econômica de suas famílias têm conseguido, com base nas avaliações do Saeb, realizado pelo MEC, alcançar resultados acadêmicos em língua portuguesa e matemática muito próximos. A dispersão entre as notas médias dos alunos que compõem os quintis extremos, quando se considera o índice socioeconômico, é a menor do País.

Esta informação deve animar a todos nós. É sinal que a educação pode sim, quando feita com foco na equidade, proporcionar a "todas" as pessoas oportunidades para uma boa sorte na sociedade. Além disso, a experiência internacional já constata que não há excelência acadêmica sem que se preze a equidade.



sábado, 19 de janeiro de 2019

Equidade educacional é a referência para definir qualidade



Falar de outra coisa além da promoção da equidade na educação é pura distração. Tenho dito em muitas outras ocasiões!

É sempre difícil definir qualidade educacional. Tenho amadurecido nas minhas percepções um critério que define essa qualidade: a escola ser capaz de quebrar a trajetória de fracasso escolar, historicamente vista, dos alunos membros de famílias de menor renda e, no contrafluxo, promover excelência acadêmica para este grupo.

Que o Ministério da Educação e todas as Secretarias Estaduais e Municipais, bem como suas respectivas redes de escolas, coloquem para si este desafio como prioridade e referência de qualidade.

Só há esse caminho para uma educação verdadeiramente transformadora!

quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

A avaliação educacional a serviço da efetividade pedagógica da escola



A discussão sobre avaliação na educação é objeto de muitos estudos e debates no mundo inteiro. Como qualquer ramo da ciência, ainda são muitas as questões pertinentes e insistentes que nos desafiam: por que avaliar? O que avaliar? Como interpretar o que se avalia? Qual a consequência pedagógica após qualquer processo avaliativo? É possível fazer algum tipo de relação entre avaliação em larga escala e a que acontece continuamente na escola?

É verdade que avançamos muito quanto à concepção sobre avaliação. Muitos pesquisadores, mesmo na afirmação de divergências quanto às perspectivas sobre avaliação, contribuem para o amadurecimento deste processo e sofisticação dos procedimentos avaliativos. As perguntas do início, como já falei, são insistentes.

Mesmo que divirjamos sobre a concepção, é sempre importante questionarmo-nos se estamos utilizando a avaliação educacional e escolar a serviço da efetividade do processo educativo, isso porque não podemos negar que avaliação é inerente ao processo de ensino. Em qualquer que seja a interação social que caracterize a intencionalidade do ensino e da aprendizagem, os envolvidos sempre se preocupam se o que foi ensinado, mesmo quando a estrutura de ensino se revela rudimentar, é efetivamente aprendido.

Como estou falando de avaliação de um modo geral, vale fazer uma diferenciação entre a avaliação educacional e a escolar. Embora potencialmente relacionadas, situamos a designação educacional a uma concepção de rede, de sistema. Portanto, estabelecem-se padrões para compreensão do funcionamento do serviço de ensino gerenciado em rede, comparando-se as escolas a partir de uma matriz de referência, que busca mapear a eficácia do sistema.

Já a avaliação escolar, elaborada e realizada diretamente pela escola e professores, obedece a padrões internos e se propõe a dar subsídios aos docentes sobre desempenho acadêmico dos estudantes, tendo como referência o processo de ensino e aprendizagem em desenvolvimento na sala de aula. Esse processo avaliativo tem um caráter eminentemente interno e não pode ser comparado entre as escolas, mesmo quando estas compõem um mesmo sistema.

Entre as divergentes concepções sobre avaliação, é possível identificar facilmente os que são a favor da avaliação em larga escala e os que não veem utilidade neste tipo de aplicação. Logo, a interação entre avaliação externa e interna é nula para quem não vê sentido em fazer instrumento de larga escala.

Esse dilema passa pelo conceito fundante da autonomia escolar que, de alguma forma, é consenso no Brasil, mas se vê estrangulado quando se depara com as diferenças do desempenho acadêmico dos estudantes que frequentam escolas diferentes.

Procuro sempre desenvolver o pensamento da conciliação entre coisas divergentes, e aparentemente opostas, neste caso, avaliação externa e interna. Procuro, sempre que possível, elaborar um pensamento que busque aproveitar ideias que possam ser consideradas antagônicas para potencializar esforços direcionados ao melhoramento do processo educativo. Então, vejamos:
  1. Entendo como razoável e necessária a ideia de se aplicar instrumentos avaliativos padronizados em larga escala a partir de uma matriz que esteja articulada com os interesses nacionais de desenvolvimento dos seus cidadãos;
  2. Nenhuma escola deve se ver isolada. Ao meu ver, é muito importante que tenhamos combinados sobre dimensões da aprendizagem que precisam ser desenvolvidos em qualquer unidade de ensino. E para isso acho importante o propósito da aplicação de instrumentos de larga escala, como o SAEB no Brasil ou o SPAECE no Ceará;
  3. A avaliação externa é uma forma, nada trivial, de envolver a sociedade no debate sobre a boa escola, mesmo tendo como referência uma medida educacional que necessite sempre de revisões e adequações ao projeto pedagógico das escolas e aos documentos normativos. Em síntese, avaliações externas devem expressar consensos sobre o que ensinar prioritariamente em cada unidade para juntos desenvolvermos um projeto de nação;
  4. A matriz de referência de uma avaliação externa jamais poderá ser o próprio currículo de uma escola. Na verdade, é um equívoco. Mas, ao considerar que essa matriz seja o acordado entre as escolas de um país ou de um sistema, vejo que suas dimensões devam estar, sim, presentes no desenvolvimento curricular de cada escola, jamais em caráter impositivo, e, sim, dialógico;
  5. Para que haja um diálogo entre a avaliação externa e interna, a escola deve ajustar seus processos pedagógicos para acompanhar o rendimento de aprendizagem observando, e não limitado, à(s) matriz(es) de referência;
  6. A avaliação interna jamais poderá perder seu caráter personalístico, de acompanhamento de cada estudante. E, para isso, a escola deve desenvolver instrumentos avaliativos diversos e mais abrangentes. A avaliação em larga escala é concebida para avaliar grandes contingentes populacionais;
  7. A interlocução com a avaliação externa não pode se resumir a aplicações de simulados com itens semelhantes ao que se usa em larga escala. O encontro destas duas avaliações deve ser estabelecido na escola pela definição dos objetivos de aprendizagem, e não simplesmente na aplicação de instrumentos, embora possa ocorrer em situações específicas.
É claro que os rankings produzidos na divulgação de resultados das avaliações em larga escala, embora a comparação entre escolas e sistemas seja salutar, criam um efeito pirotécnico, sugerindo uma simplificação demasiada da análise e escondendo as verdadeiras riquezas para o desenvolvimento do projeto de promover equidade em uma rede. Mesmo com esse limite identificado, julgo oportuno insistir numa interpretação de dados que mergulhe nas condições de aprendizagem com a intenção de se instruir caminhos para a eficácia educacional também em larga escala.

O que mais justifica avaliação em larga escala no Brasil, ao meu juízo, é o quadro de desigualdade educacional. E, para reverter esta situação, precisamos acompanhar o desempenho acadêmico em todas as escolas brasileiras, a fim de diminuir consideravelmente a diferença dos índices das desigualdades por meio de políticas públicas mais assertivas.

O que está em tela, no final das contas, é o sucesso acadêmico de todas as crianças, jovens e adultos que estão em escolarização no Brasil.

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

O desafio da educação brasileira é o fortalecimento do ensino para todos



Muito tem se falado em “ideologização marxista” do ensino como responsável pelos resultados insuficientes de aprendizagem dos estudantes. Ora, quanta distração!

Entendo que precisamos, antes da defesa de qualquer metodologia ou prática de ensino, definir o projeto de nação que a sociedade deve estabelecer para si mesma. A partir disso, a educação precisa ser estruturada a serviço deste projeto. Neste sentido, a educação não pode ser “despolitizada” e deve assumir uma intencionalidade pedagógica. Os manuais da boa educação do mundo inteiro seguem essa premissa.

O Brasil é signatário de vários tratados internacionais que versam sobre educação e o que deve guiar as políticas públicas nesta área. Esses tratados tentam estabelecer um combinado entre as nações sobre a formação de seus cidadãos e elegem diretrizes importantes para o desenvolvimento humano nas dimensões cognitiva, social, histórica, cultural e econômica.

Quando me interessei por educação, cursava a faculdade de Ciências Sociais e trabalhava como professor da educação básica, isso no final da década de 1990. A primeira experiência, como já tratei em outro texto, foi como docente de turmas que eram chamadas de Aceleração: crianças e jovens de 10 a 17 anos que não estudavam ou passaram por sucessivas reprovações foram reunidos para buscarem a inclusão regular no sistema de ensino público do estado do Ceará.

Nos primeiros anos como docente, convivi com as expectativas destas pessoas. Testemunhei o momento histórico em que a educação, como política pública, tentava alcançar a todos, indiscriminadamente. A década de 1990, percebam o quanto breve se fala em educação para todos em nosso país, foi um marco para as políticas educacionais com a abrangência que hoje estamos habituados.

Lembro que se falava muito na Academia e pelos agentes da Secretaria da Educação da Declaração Mundial sobre Educação para Todos: Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem, resultado de Conferência Mundial ocorrida em Jomtien, na Tailândia, entre os dias 5 e 9 de março de 1990.

Nesta Declaração, o item 1 do Artigo 1º manifesta: “Cada pessoa - criança, jovem ou adulto - deve estar em condições de aproveitar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de aprendizagem”.

O documento, como um todo, traz o apelo para que os países signatários tomem a decisão de elaborar políticas públicas pensando em “cada pessoa”, e não apenas nos economicamente melhor situados na sociedade. O “todos” ganha uma dimensão universal. O direito à aprendizagem é estendido para aqueles que tradicionalmente não tinham acesso à escola.

Confunde-se, então, o esforço de estruturar a educação para todos como um ato “da ideologia marxista”, e não uma ação que tenta responder a uma das maiores angústias da sociedade brasileira e mundial: a desigualdade social que reverbera na desigualdade educacional e nas oportunidades de trabalho, emprego e empreendedorismo.

Essa desigualdade exacerbada é algo que precisa ser contido em qualquer regime político ou econômico. Trata-se de um pacto universal para que tenhamos uma sociedade democrática fincada nas bases tácitas da justiça e do direito à dignidade humana.

Entendo que essa premissa compõe o projeto de nação expressos em documentos nacionais como o Plano Nacional de Educação, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Resoluções dos Órgãos Normativos, e nos instrumentos de verificação da educação, como o IDEB.

Desta forma, o que precisamos, de verdade, é do fortalecimento do ensino para termos escolas mais inclusivas e que consigam gerar as oportunidades educacionais para cada estudante. As práticas educativas devem estar articuladas para este fim. As diferentes concepções educativas e suas respectivas metodologias de trabalho pedagógico podem conviver dialogicamente para o desenvolvimento do projeto político de cada escola.

sábado, 12 de janeiro de 2019

A criança é o Messias do homem


*Por Izolda Cela


Muitos repararam, outros nem tanto. Mas a cerimônia de posse deste governo estadual para a gestão 2019-2022 teve a participação especialíssima de crianças. Foram elas que conduziram o cerimonial, nos encantaram com música, dança ou simplesmente com a integridade própria dos anos da infância que mobiliza teimosamente a nossa esperança na humanidade, no devir. A criança é o Messias do homem, são as palavras bem ditas de Cora Coralina.

Elas não estavam lá simplesmente por seus óbvios atributos. Aquela presença representa uma permanente convocação. Seremos uma sociedade melhor na medida em que sejamos capazes de cuidar bem da infância, desde os pequeninos, preferencialmente ainda no período da gestação. A convocação vem pela força que têm os primeiros anos na vida da pessoa. Cuidados, estímulos e a dose necessária de afetos são ingredientes indispensáveis para elevar a chance de um adulto com melhor capacidade de aprender, de conviver pacificamente, de trabalhar e ter mais saúde. Não é uma suposição. É evidência científica.

A desestruturação da família afetada pela indignidade da extrema pobreza e/ou pelos diversos níveis de abandono apresenta uma fatura muito alta para crianças e adolescentes, que são pessoas em desenvolvimento. Uma fatura que retorna com força dramática para a sociedade. Então, aquela presença representa também a necessária afirmação de compromisso com a infância e a juventude. Algumas daquelas crianças, e tantas outras, são prova viva daquilo que uma boa oportunidade pode representar para se ter uma perspectiva de vida melhor. Há possibilidade real de superação de enredos muito tristes que, infelizmente, ainda capturam milhares de jovens em nosso País. Não é fácil, mas é possível. Não é tarefa de rápida resolução, é de longo prazo. Não se enfrenta através de uma só frente, é serviço que deve mobilizar o Estado, em sua ampla institucionalidade, e também a sociedade em geral, em sua intransferível responsabilidade. Um dos vetores de força e alcance para abraçar a infância e a adolescência é a boa escola. Vamos nos desafiar para afirmar: aqui, no Ceará, Nem 1 aluno fora da Escola. E continuar determinados na construção de uma escola que promova aprendizagem, formação socioemocional, preparação para o trabalho e para o projeto de vida. Discernimento e renovada energia para os que põem a mão neste honroso serviço.


*Izolda Cela é Vice-Governadora do estado do Ceará.

Artigo publicado no Jornal O Povo, 10 de janeiro de 2019.

Ceará Científico


A educação básica deve se estruturar pedagogicamente de modo a preparar as pessoas para a vida contemporânea e, ao mesmo tempo, para compreenderem os espectros de um porvir ainda não plenamente revelado.

Com esta premissa, a educação pautada no repasse de informações sobre um saber historicamente acumulado não é suficiente. É preciso ir além. O método científico, definitivamente, precisa estar impregnado nos afazeres que constituem as aprendizagens.

Mais do que estudar o que os grandes pesquisadores descobriram e sistematizaram como conhecimento aceito na educação formal, é preciso compreender como suscitaram suas hipóteses, testaram seus preceitos e fundamentam suas conclusões. Mais importante que memorizar o saber, é aprender a aprender.

A curiosidade precisa ser estimulada em um processo educativo que tem como princípio a autonomia e cujo objetivo é proporcionar o desenvolvimento de competências que permitam a cada pessoa o constante exercício de aprendizagem ao longo da vida. Por conta da dinâmica das verdades, ser capaz de compreender o tempo por meio da prática da pesquisa é o guia para se alcançar a excelência acadêmica e a sensibilidade de adaptação às mudanças que regem as relações sociais e do trabalho.

Considerando este quadro para a formação integral das pessoas, a Secretaria da Educação do Ceará apoia iniciativas das escolas que buscam concatenar projetos pedagógicos a fim de proporcionar a vivência de processos de construção do saber a partir da aplicação do método científico, reconhecendo o esforço de sistematização, por parte das crianças e dos jovens estudantes, da pesquisa que fizeram para aquietar ou dar solução, mesmo que provisoriamente, a uma pergunta ou a um problema perturbador.

Com este intuito, a Seduc promove o Ceará Científico, evento que reúne a exposição de trabalhos científicos realizados nos ensinos fundamental e médio como forma de estimular o apego ao método científico como indutor da educação emancipadora. A Secretaria financia, ainda, viagens para eventos científicos nacionais e internacionais.

Asseguro que pessoas que aprenderam a fazer boas perguntas e dominam bons procedimentos para buscar respostas, são capazes de continuar aprendendo nesta sociedade cada vez mais veloz e desafiadora.



Artigo publicado no Jornal O Povo em 13 de dezembro de 2018
https://www.opovo.com.br/jornal/opiniao/2018/12/ceara-cientifico.html