quarta-feira, 20 de novembro de 2019

20 de novembro


*Por Alexsandro Santos


Num país no qual um parlamentar que integra o Congresso Nacional se sente autorizado a afirmar que "os negros" (como grupo racial) cometem mais crimes - e, por isso, são mais mortos pela polícia - do que os demais grupos raciais, simplesmente não há espaço para a dúvida da relevância da data de hoje.

A ideia - pretensamente universalista, pretensamente "desracializada" - de que datas como essa são inadequadas porque "somos todos iguais, somos todos humanos", para mim, só pode ser aceita por três categorias de sujeitos:

1. Aqueles que não compreenderam ainda que o racismo é um sistema ideológico e - portanto - deixam de enxergar seus efeitos na sua própria visão de mundo. Embora bem intencionados, seguem guiados por um conjunto de crenças e valores cuidadosamente disseminados e cultivados na sociedade racista brasileira. São brancos, são negros, são de todas as raças. Mas foram catequizados numa cartilha em que se aprende que basta não falar de racismo para ele desaparecer. Ouso chamá-los de desavisados por desconhecimento.

2. Aqueles que - no gozo dos privilégios do sistema social hierarquizado e racista - não suportam a ideia de que sua posição superior na sociedade contemporânea se explica, em grande parte, por um processo histórico mediante o qual todos os seres humanos foram obrigatoriamente racializados (mas cada um numa posição) e que uma parcela ganhou e/ou herdou benesses produzidas pelos mais de 300 anos de coisificação do corpo negro e de transformação de homens e mulheres africanos na mercadoria mais rentável do capitalismo. Vivem no chamado pacto narcísico da branquitude (ainda que, na maior parte das vezes, sua branquitude seja tão fajuta quanto a estátua da liberdade da Havan) .Ouso chamá-los de desavisados por hipocrisia (ou cinismo).

3. Aqueles que foram embriagados pelo autoritarismo e pelo protofacismo que, silenciosa e lentamente, se manteve atuante após a redemocratização brasileira e que, nos últimos anos, saiu às ruas sem nenhum tipo de borda ou limite. Vomitam, sem qualquer pudor, o racismo em palavras e em atitudes - as vezes mais implicitamente, outras mais explicitamente. Ouso chamá-los de genocidas por conivência.

Estou disposto a dialogar com os primeiros. Com algum esforço, com os segundos. Quanto aos últimos, repito o que disse Elza Soares: Meu amor, suma.



* Mestre em Educação: História, Política, Sociedade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo. Atualmente é Coordenador do Programa de Pós-Graduação da Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo e do curso de Pedagogia da Faculdade do Educador - FEDUC

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