quinta-feira, 24 de agosto de 2017

A escola e as Competências para a Vida (Parte 2)

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A escola é uma instituição social que lida com as pessoas nos momentos mais críticos da trajetória de construção da personalidade. Com este pressuposto definido, cabe a esta instituição se conceber politicamente para o desenvolvimento integral dos estudantes, considerando as dimensões cognitivas, relacionais, afetivas, culturais e sociais que compõem o imaginário das pessoas, além de dar intencionalidade pedagógica em seu projeto formativo.

Na escola que temos, construída sob o pilar do desenvolvimento industrial e forjada nos princípios da modernidade, estruturaram-se processos de ensino para cuidar, quase que exclusivamente, das aprendizagens de um currículo de base científica, com especial atenção à língua materna e matemática, o que é muito importante, mas que não dedica a devida atenção ao turbilhão de incertezas inerente ao processo de socialização e a construção da identidade pessoal, tendo como contexto uma teia social cada vez mais complexa, e, portanto, mais desafiadora para os estudantes.

Os dilemas sobre a vida são postos para todos nós na idade escolar. Na cabeça de jovens que cursam o ensino médio, muitas questões existenciais ficam pairando em seus pensamentos, questões do tipo: quem sou eu? onde estou? para onde quero ir? estou conseguindo aceitar a mim mesmo frente aos padrões já estabelecidos na sociedade, na minha comunidade? meus colegas me aceitam como eu me sonho? quem se importa com a minha felicidade? o que é mais importante, viver o agora ou me preparar para o amanhã?, entre muitas outras.

Essas questões, por mais que haja esforço para respondê-las, para maturá-las, ficam dando voltas no imaginário juvenil, gerando crises de identidade, de autoimagem, além de uma busca frenética pelo Eu na selva pantanosa das incertezas relacionais. Trabalhar as dimensões socioemocionais, além do desenvolvimento da aprendizagem dos conteúdos já considerados clássicos, neste contexto, é muito importante e pode significar o vínculo ou não dos jovens com a proposta formativa da escola.

Numa entrevista concedida ao jornal O Povo, em 21 de agosto de 2017, o pesquisador belga Filip de Fruyt disse que "a escola é um playground interessante para, literalmente, se exercitar e desenvolver as habilidades socioemocionais." Nesta perspectiva, espera-se da escola um trabalho pedagógico de base holística, em que o cognitivo e as competências socioemocionais componham o processo de aprendizagem e desenvolvimento. Visto desta forma, o que se convencionou denominar de competências socioemocionais não são conteúdos a serem ensinados, mas se configura como parte importante do desenvolvimento integral das pessoas na perspectiva de uma proposta pedagógica que não aparta o cognitivo de outras dimensões caras à socialização e à construção da identidade pessoal.

É importante observar que não defendo a introdução da agenda de desenvolvimento das competências socioemocionais na escola com vistas, simplesmente, à adequação a um por vir, isto é, como meio de preparar o jovem para o mundo do trabalho, mas, substancialmente, como estratégia a ser incorporada no currículo escolar para que os jovens se sintam acolhidos numa proposta educativa que dialoga com suas necessidades do presente, do seu tempo. A escola que fala somente de um futuro, das necessidades de se preparar para a fase adulta, produtiva, tem grande dificuldade em se conectar com os interesses e necessidades dos jovens.

Os pesquisadores Paulo Carrano e Carlos Henrique Martins, no texto A escola diante das culturas juvenis: reconhecer para dialogar, afirmam que "Os jovens possuem um significativo campo de autonomia perante as instituições do denominado 'mundo adulto' para construir seus próprios acervos e identidades culturais." Dialogando com estes pesquisadores, a proposta pedagógica precisa estar fundada na premissa de que, para se ter estudantes motivados a aprender o que se definiu no currículo, é necessário reconhecer as culturas juvenis, suas expressões, e trazer o jovem por inteiro para participar da sua aprendizagem. Isso quer dizer que, em vez de buscar a construção de um ser humano idealizado, a escola precisa ser capaz de estabelecer diálogo com as variadas manifestações dos jovens e construir um itinerário formativo que os ajude no complexo processo de desenvolvimento.

A escola que queremos precisa se organizar para ajudar os estudantes a viverem suas incertezas. Banalizá-las e, consequentemente, ignorá-las, dizendo: "essa fase vai passar", oficializa o desrespeito ao momento que os jovens estão passando e que precisa ser vivido com toda a intensidade característica desse momento. É função da escola, nesse sentido, orientar os jovens para o fortalecimento de uma visão de si mesmos fundada na solidariedade, na resiliência, na abertura ao novo etc. O protagonismo do jovem na escola, portanto, precisa ser aguçado, estimulado, para que tenhamos em nossa sociedade pessoas mais empoderadas, com projetos de vida que expressem uma visão conciliadora entre o "quem sou" e a "visão de mundo e de futuro".

Diante desta narrativa, a escola não pode se mostrar insensível aos anseios pessoais dos jovens. Entre suas intencionalidades formativas, a escola deve direcionar esforços pedagógicos para ajudar os estudantes a dialogarem consigo mesmos, a viverem sua cultura juvenil, em vez de expor aos estudantes um padrão educacional que os direciona para viver um futuro idealizado, por demais abstrato.

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