De verdade, acredito que todas as pessoas são capazes de desenvolver aprendizagem escolar. Não acredito em vocação inata para os estudos, na história de que nem todos nasceram para "se dar bem" na educação formal.
A não aprendizagem, quando se registra, deve-se a muitos fatores, de todas as ordens, internas e externas à escola, e que não são, absolutamente, determinantes. Mas há um fator, muitas vezes mencionado, que não consigo levar adiante: desinteresse deliberado do estudante.
Com esta premissa posta, tenho a convicção de que uma escola que possua um currículo bem estruturado; uma noção clara dos saberes e competências primordiais que devem ser desenvolvidos com prioridade; que conta com um serviço pedagógico fortemente munido de instrumentos de acompanhamento da aprendizagem de modo individualizado e com um bom repertório de intervenções pedagógicas, consegue ensinar com qualidade aos estudantes tudo aquilo que se propõe para sua idade e série, mesmo àqueles que entram na vida escolar carregando todas as controvérsias de uma uma vida econômica e social desafiadora.
Não faltam exemplos para corroborar com esta minha convicção. Mesmo no Brasil. Mesmo na educação pública. Até porque não estou falando a partir de uma utopia, mas baseado em pesquisas que conseguem identificar características de funcionamento escolar que dá efetividade ao processo de aprendizagem.
A grande questão é que insistimos em colocar na conta do estudante o "fracasso escolar", principalmente quando chegam ao ensino médio. Ora como vítima por ter passado pelas etapas anteriores sem aprender a ler, escrever e a fazer cálculos elementares; ora por não manifestar, simplesmente, o interesse pela escola.
Por outro lado, quando o estudante se destaca, embora se reconheça o esforço individual, atribui-se à escola "o sucesso". Essa divisão de ônus e bônus no processo de aprendizagem e ensino não é razoável. Podemos ir além da noção de herói e vilão e construir uma visão compartilhada de esforços individuais dos estudantes e responsabilidades institucionais da escola.
Rubem Alves sintetizou bem o processo de ensino e aprendizagem usando a seguinte referência metafórica: "Esta é a regra fundamental desse computador que vive no corpo humano: só vai para a memória aquilo que é objeto do desejo. A tarefa primordial do professor: seduzir o aluno para que ele deseje e, desejando, aprenda."
O desejo, que Rubem Alves trata, se cria ou se fortalece pela alimentação da esperança, em outras palavras, de que se pode aprender quando temos ao dispor um trabalho pedagógico bem sistematizado e o envolvimento do estudante no processo educativo. É um desejo que se educa, não um desejo que se desenvolve naturalmente.
Quando o estudante tem à sua disposição uma estrutura pedagógica fundamentada na premissa de que a escola faz a diferença na vida das pessoas, em que todas as dimensões associadas ao processo de aprendizagem são assistidas intencionalmente, a partir de um projeto pedagógico direcionado para a aprendizagem de todos, as chances de se ter um bom desempenho escolar são muito promissoras.
Agora, por outro lado, ao se concluir que a instituição escolar é impotente para desenvolver seu projeto pedagógico frente ao histórico de reprovações de alguns estudantes, que gerou distorção série-idade ou porque o fizeram acreditar que a escola não foi feita para muitos deles, enterra-se boa parte das oportunidades educacionais.
Nessa perspectiva, a escola precisa, em linhas gerais:
- Estabelecer, em seu currículo, o que todos os alunos devem aprender. Quero dizer com isso que a tarefa essencial da escola não é cumprir o sumário dos livros numa ansiedade de dar conta de todo o conhecimento estruturado. Mais do que o domínio de informações sobre os assuntos abordados em todos os componentes curriculares, os estudantes precisam ser instigados a processar o saber, maturá-lo, ao invés de escutar aulas;
- Com a definição do currículo essencial, estrutura-se um processo contínuo de avaliação. Enquanto o processo pedagógico estiver marcado por avaliações que identificam o quanto se memorizou em cada disciplina, aplicadas de forma pontual, dificilmente se garantirá um processo intencional de aprendizagem para todos;
- E para este circuito funcionar, é importante que o serviço de acompanhamento pedagógico seja guiado para apoiar os professores em seu processo de ensino, trazendo como principal insumo, neste apoio ao professor, o desempenho acadêmico de cada estudante.
A lista acima não é um receituário, mas uma indicação que precisamos ter foco no processo de aprendizagem a partir de um método de acompanhamento pedagógico bem definido e pactuado com todos os sujeitos envolvidos com a implementação do projeto escolar: gestão, professores, alunos e pais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Agradeço pelo comentário.